Mãe agencia programa e oferece vender filha menor por R$ 500 no Pará
Reportagem do Fantástico simulou compra em Portel (PA).
Prostituição de menores ocorre livremente nas ruas.
Uma mãe foi flagrada agenciando programas para a própria filha, menor de idade, em troca de "quatro cervejas" e oferecendo vender a menina por R$ 500. Os crimes foram registrados pela reportagem do "Fantástico" na pequena Portel, cidade do Pará isolada a 18 horas de barco de Belém, onde a prostituição de menores ocorre livremente nas ruas.
Usando uma câmera escondida, a reportagem foi em busca dos aliciadores que fazem o contato entre os interessados e as famílias. Na tabela da exploração sexual de menores, a noite com uma virgem pode custar R$ 1 mil. Geralmente tudo é feito com conhecimento dos pais.
Programa por cerveja
Edina dos Santos Balieiro, a mãe que pediu R$ 500 pela filha, é dona de um bar em Portel. A reportagem simula primeiro interesse num programa com a adolescente de 17 anos. A mãe aceita negociar:
Repórter - “Quer alguma coisa aí?”
Mãe - “Deixa quatro cervejas aí pra mim beber..”
Repórter - “Quantas?”
Mãe - “Quatro.”
A menina acompanha tudo de perto sem interferir.
“Você acha que eu vou dar minha filha por R$ 10, é ?”, diz a mãe, pegando os R$ 10 da mão do suposto cliente. “É louco, é ?”, diz ela enquanto amassa o dinheiro com a mão e guarda.
Apesar do que diz, a mãe fica, sim, com o dinheiro para comprar as cervejas. E a menina chega a entrar num táxi. O repórter revela então que não vai haver programa. E a jovem é levada de volta pra casa.
No dia seguinte, a reportagem voltou ao bar e simulou interesse não apenas em um programa mas em comprar a jovem. O repórter deixa claras suas supostas intenções: levar a moça, e fazer com ela o que quiser.
Antes do acerto, a mãe faz uma única exigência: “Pode viajar. Pode ir. Ela... só quero um número de telefone pra ligar. Ela me ligar.”
No dia seguinte, Edina fala qual é o preço para entregar a filha:
Repórter - “Aquela nossa conversa tá de pé, não tá?”
Mãe - “Tá.”
Repórter - “A senhora falou pra ela e ela falou o que?”
Mãe - “Eu tenho coragem de ir, mamãe.”
Repórter - “Ela tem coragem?”
Mãe - “Tem. Chega lá, fala: ‘Vim te buscar pra gente viajar.’”
Repórter - “Mas quanto? quinhentos, mil, duzentos?
Mãe - “Ah, não sei... cê que sabe.”
Repórter - “R$ 500?”
Mãe - “Talvez , né? Tou ouvindo ... cê que sabe.”
Na hora de fechar a negociação da compra da jovem, Edina define o preço da filha:
Repórter - “A senhora acha que quanto fica bom pra senhora?”
Mãe - “Aquilo que cê tinha me falado da outra vez.”
Repórter - “Quanto?”
Mãe - “O que cê me falou tá bom.”
Repórter - “Quanto? R$ 500?”
Mãe - “R$ 500 tá bom pra mim.”
Repórter - “R$ 500, né?”
Mãe - “É.”
A reportagem não chega a concretizar o negócio e diz a Edina que voltaria com o pagamento depois.
14 anos de prisão
Cada passo da reportagem foi acompanhado por pessoas ligadas à Igreja Católica. “Essa mãe precisa responder a um processo. Ela cometeu um crime. A polícia precisa apurar isso. Sem o exemplo de que a lei existe as pessoas vão continuar praticando isso dentro da normalidade”, afirma o defensor público Anginaldo Oliveira.
De acordo com a lei brasileira, Edina pode pegar até 14 anos de prisão por exploração sexual e venda da filha.
"Está se perdendo em muitas regiões do Pará e também no Marajó, o respeito, a valorização de uma menina, de um menor, de uma menor. E perdendo esse respeito as bases de uma sociedade estão minadas”, afirma José Luiz Azscon, bispo de Marajó.
Miséria e exploração
A renda média dos moradores de Portel está bem abaixo do salário mínimo nacional: R$ 229 por mês, segundo o IBGE. A prefeitura estima que quase 80% dos adultos da cidade não têm trabalho fixo.
“Há elementos econômicos, há elementos de empobrecimento, mas não é so isso [que explica a prostituição e venda de menores no local]", diz a deputada Maria do Rosário (PT-RS), relatora da CPI da Exploração Sexual. "Há uma cultura em torno de estar num meio onde se pode ganhar algum dinheiro com a sexualidade. Porque há um apelo sobre a sexualidade permanente em todos os ambientes”, completa.
“Lá, mulher não é uma mercadoria. Lá, mulher é um lixo, porque uma mercadoria vale bem mais. ela tem um valor”, diz uma jovem, sob anonimato, que nasceu e passou a adolescência em Portel. Vítima de estupro aos 13 anos, decidiu denunciar o que se passa na cidade paraense.
“Muitas mães, elas acostumaram com a cultura de lá. E acham que negociando a filha vai ser normal. Eu vejo aquilo lá como a parte de um verdadeiro inferno, de um purgatório, onde a gente é mutilado, destruido e tem que se calar e se redimir por si próprio”, disse.
A delegada Socorro Maciel diz que a venda de uma filha pela mãe não a surpreende. “Não me surpreendo porque a gente sabe que acontece. Infelizmente acontece. Não só no Pará. A gente sabe que em todo o brasil acontece isso”, diz.
Do G1, com informações do Fantástico
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