quarta-feira, 24 de outubro de 2012
89% querem reduzir maioridade penal no país
Para 50% da população, limite de prisão deveria ser maior que os atuais 30 anos, afirma estudo do Senado.
Pesquisa do Senado também perguntou sobre drogas aborto e outros temas.
Enquanto o Brasil assiste ao julgamento do mensalão, o Senado divulgou o resultado de uma pesquisa realizada pela sua Secretaria de Opinião Pública indicando que 89% da população é a favor de aumentar a maioridade penal. Divulgado hoje (23.out.2012), o estudo foi realizado por telefone com 1.232 pessoas de 119 municípios, incluindo todas as capitais. A margem de erro é de 3 pontos percentuais.
Os dados mostram que 20% dos brasileiros acham que a lei deveria permitir a prisão das pessoas a qualquer idade. Outros 16% acham que a maioridade penal deveria começar aos 12 anos. Para 18%, isso deveria ocorrer aos 14 anos. E 35% disseram que 16 anos é a idade mínima que alguém deve ter para ir preso. Só 7% concordam com a atual regra, que estabelece a maioridade penal a partir dos 18 anos. Deram outras respostas 3% dos entrevistados e 1% não soube ou não quis responder.
A pesquisa foi feita porque os senadores estão analisando um projeto de mudanças para o Código Penal, o PLS 236/2012. Outras perguntas também foram feitas aos entrevistados.
Os resultados mostram também que 50% da população acham que o limite de 30 anos de prisão deveria aumentar. O tempo máximo de reclusão deveria ser de 40 anos (para 9% dos entrevistados), 50 anos (para 36%) ou não ter limite (para 5%). A atual regra está correta para 17%. Mas 8% acham que deveria diminuir para 20 anos e 9%, para 10 anos. Outras respostas foram dadas por 6% e 9% não souberam ou não responderam à questão.
DROGAS -Sobre drogas, o estudo aponta 89% da população a favor da que a lei proíba que uma pessoa produza e guarde drogas para consumo próprio. Só 9% concordaram a permissão. E 1% não soube ou não quis responder à pergunta.
ABORTO -A maioria das pessoas (82%) é contra o aborto quando o procedimento é adotado porque a mulher não deseja o filho. Mas a maioria fica a favor do aborto quando a gravidez coloca a vida da mulher em risco (74%), é causada por estupro (78%) ou quando o bebê possa morrer após o nascimento por conta de doença (67%).
De Fenando Rodrigues
http://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2012/10/23/89-querem-reduzir-maioridade-penal-no-pais/
As três fatias do bolo eleitoral
O PT sabe avançar na agenda alheia, mas, desde 2006, a oposição, petrificada, prega para os convertidos
FALTAM POUCOS dias para o desfecho da eleição municipal e são fortes os sinais de que o PT terá o que comemorar. Qual a explicação para o desempenho dos companheiros se a economia vai devagar, quase parando, e a cúpula do partido de 2005 está a caminho do cárcere?
Aqui vai uma tentativa: desde 2002, quando Lula assinou a Carta aos Brasileiros e venceu a eleição incorporando pilares da política econômica de Fernando Henrique Cardoso, o PT move-se livremente sobre o campo adversário (quem quiser, pode dizer que ele vai à direita, mas essa imagem é insuficiente).
Já a oposição, petrificada, não consegue sair do lugar. Em alguns momentos, radicaliza-se, incorporando clarinadas do conservadorismo europeu e americano.
O tema do aborto, do "kit gay" e a mobilização do cardeal de São Paulo ao estilo da Liga Eleitoral Católica dos anos 30, exemplificam essa tendência. (Registre-se aqui a falta que faz Ruth Cardoso. Com ela, não haveria hipótese de isso acontecer.)
Admita-se que o eleitorado se divide em três fatias. Uma detesta o PT e tem horror a Lula. Outra, no meio, pode ir para qualquer lado. O terceiro bloco gosta de Nosso Guia e não se incomoda quando ele pede que vote em seus postes. Se um bloco se move e o outro fica parado, sempre que houver eleição, o PT prevalecerá.
Some-se à paralisia da oposição uma ilusão retórica. Desde 2010 suas campanhas eleitorais estruturam-se como pregações aos convertidos. O sujeito tem horror a Lula, ouve os candidatos que o combatem e fica duas vezes com mais raiva. Tudo bem, mas continua tendo apenas um voto. Já o PT segue uma estratégia oposta. Sabe que os votos de esquerda vêm por gravidade e vai buscar apoios alhures.
A crença de que o julgamento do mensalão seria uma bala de prata para a oposição revelou-se falsa. Já as crendices petistas segundo as quais o Supremo se tornou um tribunal de exceção ou que o impacto de suas sentenças seria irrelevante são um sonho maligno.
As condenações podem ter sido eleitoralmente insuficientes para derrotar os companheiros, mas não foram irrelevantes. O PT deve prestar atenção à voz do Supremo, pois a corte não é uma mesa-redonda de comentaristas esportivos. Ela é o cume de um Poder da República.
Eleição não absolve réu, assim como o Supremo não elege prefeito. Se Lula e o PT acreditarem que o eleitorado respondeu ao Supremo, estarão repetindo o erro dos generais que viam nos resultados dos pleitos da década de 70 uma legitimação indireta do que se fazia, com seu pleno conhecimento, nos DOI-Codi.
O comissariado deveria ter a honestidade de admitir que acreditou na impunidade dos mensaleiros. Resta-lhe agora o vexame de reformar o estatuto do partido, que determina a expulsão dos companheiros condenados em última instância.
A oposição tem dois anos para articular uma agenda que lhe permita avançar sobre a plataforma petista. Ela não precisa se preocupar com a turma que detesta Lula, essa virá por gravidade, assim como os adoradores de Nosso Guia continuarão seguindo-o.
Fazendo cara feia para os programas sociais do governo, para as políticas de ação afirmativa nas universidades e para a expansão do crédito popular, ela organizará magníficos seminários. Eleição? É coisa de pobre.
De Elio Gaspari na Folha de São Paulo de 24/10/2012
sábado, 20 de outubro de 2012
Hegemonia PT 3.0
Fernando Haddad protagonizou uma das mais espetaculares recuperações numa campanha para prefeito de São Paulo e deve dar ao PT, dizem as pesquisas, o comando da maior cidade do país.
A eleição paulistana é um passo relevante no projeto de hegemonia política do PT. Nenhum partido cresce de maneira orgânica e consistente como o PT a cada disputa municipal. A sigla sempre se sai melhor.
PMDB, PSDB, DEM (o antigo PFL) e outros já tiveram dias de glória, mas acumulam também vários revezes. O PT, não. Só cresce.
Embora já tenha vencido em São Paulo duas vezes (em 1988, com Luiza Erundina, e em 2000, com Marta Suplicy), agora com Fernando Haddad é uma espécie de PT 3.0 que pode chegar ao poder.
Não há outro partido da safra pós-ditadura militar que tenha conseguido fazer essa transição de gerações. O poderio sólido e real que o PT constrói encontra rival de verdade apenas na velha Aliança Renovadora Nacional (Arena), a agremiação criada pelos generais para comandar o Brasil -com a enorme diferença de hoje o país viver em plena democracia.
Alguns dirão que o PMDB mandou muito no final dos anos 80. Mais ou menos. Tratava-se de um aglomerado de políticos filiados a uma mesma sigla. Não havia orientação central.
O PSDB ganhou em 1994 o Planalto e os governos de São Paulo, Rio e Minas Gerais. Muito poder. Só que os tucanos nunca tiveram um "centralismo democrático" (sic) "à la PT".
No dia 28 de outubro, há indícios de que o PT novamente sairá das urnas como o grande vencedor nas cidades com mais de 200 mil eleitores, podendo levar pela terceira vez a joia da coroa, São Paulo.
Ao votar dessa forma, o eleitor protagoniza duas atitudes -e não faço aqui juízo de valor, só constato. Elege seu prefeito e entrega à sigla de Lula um grande voto de confiança para fazer do PT cada vez mais um partido hegemônico no país.
De Fernando Rodrigues na Folha de São Paulo de 20/08/2012
A eleição paulistana é um passo relevante no projeto de hegemonia política do PT. Nenhum partido cresce de maneira orgânica e consistente como o PT a cada disputa municipal. A sigla sempre se sai melhor.
PMDB, PSDB, DEM (o antigo PFL) e outros já tiveram dias de glória, mas acumulam também vários revezes. O PT, não. Só cresce.
Embora já tenha vencido em São Paulo duas vezes (em 1988, com Luiza Erundina, e em 2000, com Marta Suplicy), agora com Fernando Haddad é uma espécie de PT 3.0 que pode chegar ao poder.
Não há outro partido da safra pós-ditadura militar que tenha conseguido fazer essa transição de gerações. O poderio sólido e real que o PT constrói encontra rival de verdade apenas na velha Aliança Renovadora Nacional (Arena), a agremiação criada pelos generais para comandar o Brasil -com a enorme diferença de hoje o país viver em plena democracia.
Alguns dirão que o PMDB mandou muito no final dos anos 80. Mais ou menos. Tratava-se de um aglomerado de políticos filiados a uma mesma sigla. Não havia orientação central.
O PSDB ganhou em 1994 o Planalto e os governos de São Paulo, Rio e Minas Gerais. Muito poder. Só que os tucanos nunca tiveram um "centralismo democrático" (sic) "à la PT".
No dia 28 de outubro, há indícios de que o PT novamente sairá das urnas como o grande vencedor nas cidades com mais de 200 mil eleitores, podendo levar pela terceira vez a joia da coroa, São Paulo.
Ao votar dessa forma, o eleitor protagoniza duas atitudes -e não faço aqui juízo de valor, só constato. Elege seu prefeito e entrega à sigla de Lula um grande voto de confiança para fazer do PT cada vez mais um partido hegemônico no país.
De Fernando Rodrigues na Folha de São Paulo de 20/08/2012
sexta-feira, 12 de outubro de 2012
Pelo fim da remuneração dos vereadores
Agora é o momento de apoiar a PEC pelo fim dos subsídios aos vereadores na maior parte das cidades. Ela vai afastar certas figuras pitorescas e indesejáveis
Alvissareira, por isso, a proposta de emenda constitucional (PEC) 35/2012, de autoria do senador Cyro Miranda (PSDB-GO).
Resgatando, em parte, o modelo do art. 16, § 2º, da Constituição de 1967, ela propõe a extinção, nos municípios com população inferior a 50 mil habitantes, dos subsídios dos vereadores, limitando-os, ainda, nos municípios de até 100 mil, 300 mil e 500 mil habitantes.
A iniciativa visa a conferir um novo papel aos vereadores desses pequenos municípios. A atividade não remunerada resgatará o verdadeiro papel honorífico e social do exercício a política local.
Afastará do cenário político, ainda, uma série de figuras pitorescas -bem identificadas na propaganda eleitoral-, cujo intento de ingresso nas câmaras municipais é unicamente fundado no percebimento de subsídios (nem sempre módicos) pela participação em duas a quatro sessões mensais.
A Constituição Federal (artigo 38), diversamente de outros cargos eletivos, não impede, como regra, que os vereadores exerçam, concomitantemente, sua profissão. Veda, apenas, a acumulação da vereança com o cargo púbico, mas exclusivamente quando haja incompatibilidade de horários (algo raro nos municípios menores). Logo, o ocupante do cargo de vereador não deve depender dos subsídios na Câmara para manter sua vida independente.
Dados do IBGE de 2010 revelam que o Brasil tem aproximadamente 5.500 municípios, praticamente 90% deles com população inferior a 50.000 habitantes.
Levando-se em consideração que cada câmara desses municípios menores (geralmente os de menor orçamento) tem entre 9 e 13 vereadores, fácil concluir a economia de recursos com a extinção dos subsídios. Certamente, bem administrados, esses valores poderão ser vertidos em favor da saúde, obras públicas, projetos sociais etc. -ou do próprio propósito fiscalizador das Câmaras Municipais.
A extinção ou a redução dos subsídios das câmaras municipais, contudo, não precisa esperar o beneplácito do Congresso Nacional com a aprovação da PEC 35/2012.
É plenamente possível que as próprias câmaras municipais aprovem leis extinguindo ou reduzindo os subsídios dos vereadores para valores módicos, simbólicos, verdadeiras ajudas de custo.
Para isso, é fundamental que a sociedade civil e, principalmente, os eleitores destes pequenos municípios, se posicionem, exigindo de seus candidatos recém-eleitos efetivo compromisso com a extinção ou redução dos subsídios logo no início próxima legislatura.
Só assim seremos capazes de conquistar, em breve intervalo, profundo avanço na representação política municipal e na qualidade dos vereadores de nosso país.
Texto de FERNANDO DA FONSECA GAJARDONI, 37, professor doutor de direito processual da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP e juiz eleitoral
Na Folha de São Paulo de 08/10/2012
O Copom inaugura uma nova política monetária
Na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) ficou assentado que, por um longo tempo, as autoridades monetárias não vão elevar a taxa de juros básica, que foi fixada em 7,25% ao ano. Se houver pressão inflacionária, tudo indica que terão de optar por medidas macroprudenciais.
Para essa decisão, o Copom seguiu toda uma liturgia, respeitando as normas da instituição. O diretor de Assuntos Internacionais, Luiz Awazu Pereira, na quinta-feira da semana passada já havia deixado claro que o Banco Central iria dar nova direção a sua política, aviso bem entendido pelos players do mercado financeiro. Na reunião, três membros do Copom votaram contra uma nova redução da taxa básica, meio tradicional de avisar que, na próxima reunião, não haveria nova redução.
Todavia, a expressão mais direta da vontade dos membros do Copom está no comunicado da decisão: "O comitê entende que a estabilidade das condições monetárias por um período de tempo suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta, ainda que de forma não linear".
Esse comunicado, bastante hábil, indica que a meta de inflação não foi esquecida, mas que por um longo tempo se procurará atingi-la por outro modo que não a taxa Selic, que em termos reais (deduzida a inflação) deve estar em torno de 1,65%/1,66%, o que coloca o Brasil na categoria de países com menor taxa básica real. O comunicado está dando uma "dica" ao dizer que a inflação convergirá para a meta "de forma não linear", isto é, por meio de medidas macroprudenciais.
Não há dúvida de que a Selic atingiu o ponto mais baixo suportável para a economia, no quadro da política de redução da taxa de juros praticados. As autoridades monetárias consideram que seria reconhecer erros ter de voltar a elevar de novo a Selic. A experiência do uso de outras medidas já se mostrou eficiente e o Copom pretende recorrer a elas, se for necessário.
Trata-se de uma aposta ousada da parte do Copom, que optou por não usar tão cedo a taxa Selic para conter eventuais pressões inflacionárias, justamente quando se verifica uma nova onda de alta dos preços.
A evolução da taxa cambial continua sendo outra preocupação, sabendo que a desvalorização pode ser mais acentuada e que o Banco Central tem uma força de intervenção limitada. Na realidade, a condução da luta contra a inflação está se tornando cada vez mais complexa.
Editorial d'O Estado de São Paulo de 12/10/2012
segunda-feira, 8 de outubro de 2012
Poderes e deveres dos juízes
No debate aqui travado sobre o Código de Processo Civil, nos parece claro que os críticos têm a razão. A liberdade de defesa fica comprometida pelo projeto
Os professores Ives Gandra da Silva Martins e Antonio Cláudio da Costa Machado¹ travaram oportuno debate com os deputados Sérgio Barradas Carneiro e Fábio Trad e os professores Fredie Didier Jr e Luiz Henrique Volpe Camargo², em artigos anteriores neste blog.
Eram assunto os poderes do juiz no projeto de Código de Processo Civil. Julgamos oportuno levar ao conhecimento dos leitores estudo aprovado pela Academia Paulista de Letras Jurídicas, integrada por 80 juristas de renome. O centro do problema é justamente o caráter de autoritarismo do projeto.
Quando se quer atender a interesses do Estado (lícitos ou ilícitos), abandonam-se os princípios garantidores dos direitos individuais, fortalecem-se os poderes do juiz e restringe-se a atividade das partes mediante a imposição de fórmulas, a redução dos recursos e a caracterização exagerada de infrações processuais puníveis.
É o que pretende o projeto: deixam-se de lado princípios fundamentais do processo civil democrático, enquanto na prática forense tira-se do litigante o direito à livre argumentação, cerceia-se a liberdade dos advogados e põem-se obstáculos aos recursos, seja diminuindo os casos de seu cabimento, seja impedindo que eles suspendam a execução das decisões atacadas.
As indicações pontuais podem não ser expressivas quando se considera o espírito que se quer imprimir ao novo código. Assim, é temerária a tutela antecipada, sem urgência e sem a oitiva da parte, mediante apenas a alegação de direito evidente, ainda que com apoio em tese jurídica dominante.
Quanto à prova, embora incontroverso que ela se destina à formação do convencimento do juiz, não se pode entregar toda a condução da sua produção ao magistrado, que na maioria das vezes nem identifica, de plano, o cerne do litígio.
Por outro lado, os ilustres deputados e professores não atentaram para o fato de que os autores do libelo referiram-se à falta de recurso imediato contra a decisão a respeito da prova, não contra a decisão que altera a ordem da sua produção.
Avaliando a proposta de código, ver-se-á que a razão está com Ives Gandra e Antonio Cláudio, se, entre outros, considerarmos que:
a) Suprir pressupostos processuais (exigências legais para estabelecer o processo) é permitir que a Justiça aproveite processos nulos;
b) Dilatar prazos processuais e inverter a ordem dos atos afronta o direito constitucional de garantia do devido processo legal;
c) Oficiar para que promovam ação coletiva (transformar em uma única ação coletiva processos individuais semelhantes) é atividade espúria ao juiz no processo democrático;
d) A solução das lides mediante simples aplicação de princípios constitucionais volta-se contra a nossa tradição de respeito à lei escrita, comprometendo a estabilidade jurídica, contra o artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil;
e) A supressão do efeito suspensivo da apelação é arbitrária. A garantia de que só depois do exame do relator se decidirá sobre aquele efeito é inócua, porque ato contínuo será o julgamento do recurso. A disposição tem a principal finalidade de fortalecer os poderes do juiz;
f) A enumeração taxativa das hipóteses de sentença sem fundamentação limita a arguição de nulidade dos julgados;
g) Poderes exacerbados do juiz são também os que permitem a alteração da vontade do litigante, mediante um artifício no texto: é o artigo 309, cuja redação deve ser comparada à do atual artigo 289;
h) O projeto não convence sobre o juiz não decidir sem ouvir as partes. O juiz ouve, mas decide como bem entende. A regra há de ser cogente: se ocorrer tal situação, a decisão será esta ou aquela;
i) A enumeração taxativa dos casos de cabimento de recurso contra decisões no curso do processo;
j) O número excessivo de hipóteses de punição de comportamentos da parte ou do advogado, mediante até a imposição de penas pecuniárias.
Esses poderes tiram o projeto da trajetória democrática do processo civil brasileiro. Parece um projeto não destinado a regular o processo, mas sim a atividade judiciária.
O acesso à justiça, que a Constituição promete, supõe a liberdade de litigar. Ela tem sido o traço característico do processo judicial brasileiro, que, em sua longa história, no cível e no crime, fez efetivas as garantias institucionais e constitucionais contra o autoritarismo e o arbítrio.
Da Folha de São Paulo de 08/10/2012
MILTON PAULO DE CARVALHO, 81, é advogado. Foi professor titular de direito processual civil na Universidade Presbiteriana Mackenzie e é membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas
RUY MARTINS ALTENFELDER SILVA, 73, é advogado e presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas
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(1) http://amorordemeprogresso.blogspot.com.br/2012/09/o-poder-dos-juizes-no-novo-codigo-de.html
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(2) http://amorordemeprogresso.blogspot.com.br/2012/10/os-deveres-dos-juizes.html
Os deveres dos juízes
O novo Código de Processo Civil não dá superpoderes ao juiz. É erro afirmar que ele generaliza execução imediata da sentença ou impede recursos das partes
Dois respeitados professores publicaram texto¹ com duras críticas ao projeto de reforma do Código de Processo Civil (CPC) que tramita na Câmara ("O poder dos juízes", de Ives Gandra da Silva Martins e Antônio Claudio da Costa Machado). Para eles, o texto projetado dá superpoderes aos magistrados e diminui "perigosamente os direitos das partes".
Participantes do processo de discussão da comissão especial que analisa o novo CPC, queremos registrar que as críticas não procedem.
Os professores afirmaram que "os juízes poderão decidir tudo em matéria probatória sem que caiba qualquer recurso (...) de imediato".
Pelo código vigente, já não existe a possibilidade de revisão imediata da decisão do juiz de primeiro grau sobre o deferimento ou indeferimento de produção de prova.
Independente disso, o fato é que no relatório, que foi apresentado no dia 19 de setembro, na Câmara, há previsão do cabimento de recurso de processamento imediato (agravo) contra a decisão do juiz que inverter o ônus da prova. O projeto, portanto, altera a regra atual para que essa questão seja resolvida rapidamente, com um único recurso.
Também não procede a crítica de que o projeto amplia a possibilidade de concessão de tutela antecipada (medida que antecipa os efeitos do julgamento), só "à vista de um bom documento apresentado pelo autor".
O projeto permite, sim, a tutela antecipada sem urgência, antes da ouvida do réu, em duas hipóteses, sendo que apenas uma delas é novidade: a que permite a medida quando as alegações de fato puderem ser comprovadas documentalmente e já houver tese jurídica firmada pelos tribunais superiores a respeito. Assim, prestigia-se a igualdade e a duração razoável do processo, com o respeito ao entendimento de tribunal superior.
Não é correta, também, a crítica de que não há critérios estabelecidos na lei à concessão de medidas cautelares pelo órgão jurisdicional. O projeto, na mesma linha do que já acontece atualmente, exige a demonstração da probabilidade do direito e o perigo da demora.
Afirmam ainda os professores que os "juízes poderão proferir suas sentenças observando princípios abstratíssimos, o que vai facilitar enormemente o subjetivismo judicial".
Os princípios citados têm fundo constitucional. Não foram criados pelo projeto. Justamente para evitar qualquer abuso de poder no caso de sua aplicação, o projeto exige fundamentação densa, inovação legal substancial que passou ao largo da análise dos professores.
Por fim, também não é válida a crítica de que o projeto generaliza a execução imediata da sentença. O texto é claro: a sentença não produz efeitos até decisão do relator que receber a apelação. Se houver risco de dano e probabilidade de êxito, a sentença que foi apelada não produzirá efeitos até o julgamento do recurso. A sentença somente produzirá efeitos imediatos nas mesmas hipóteses que atualmente.
Na verdade, jamais existiu um CPC do qual se pudessem extrair tantos deveres do juiz.
Exemplos: a) proibição de decisão-surpresa: o juiz não pode decidir com base em nenhuma questão a respeito da qual as partes não tiveram a oportunidade de pronunciar-se; b) o juiz tem o dever de enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de influenciar a sua decisão; c) dever de uniformizar a jurisprudência, mantê-la estável e respeitá-la; d) dever de indicar o defeito a ser corrigido, antes de indeferir a petição inicial ou o recurso.
São enunciados inéditos no Direito brasileiro, que servem para conter os poderes do juiz.
O projeto do novo CPC, como toda obra humana, é passível de críticas. Considerá-lo um projeto de contornos autoritários, porém, não é justo. Trata-se de um projeto construído democraticamente. Após a leitura do relatório, a previsão é de discussão da matéria no próximo dia 10 de outubro, com votação em 16 ou 17 de outubro, na comissão especial da Câmara.
Da Folha de São Paulo de 01/10/2012
Texto de:
SÉRGIO BARRADAS CARNEIRO, 51, deputado federal (PT-BA) e relator-geral da comissão especial do projeto de CPC na Câmara dos Deputados
FÁBIO TRAD, 43, é deputado federal (PMDB-MS) e presidente da comissão especial do CPC na Câmara dos Deputados
FREDIE DIDIER JR., 38, advogado, livre-docente pela USP e professor da Universidade Federal da Bahia
LUIZ HENRIQUE VOLPE CAMARGO, 36, advogado, mestre em direito pela PUC-SP e professor Universidade Católica Dom Bosco (MS)
(1) http://amorordemeprogresso.blogspot.com.br/2012/09/o-poder-dos-juizes-no-novo-codigo-de.html
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
Regular doações e despesas de campanha
Kofi Annan escreve
Ameaças à integridade eleitoral não se limitam a países pobres. Fraudes são muito ruins, mas o crescimento explosivo de gastos de campanha é um outro risco
Nos últimos 20 anos, a democracia tem se difundido pelo mundo, sublinhando que é um valor e um desejo universal.As eleições são fundamentais. Dão uma voz aos cidadãos nas decisões que lhes dizem respeito e, por outro lado, proporcionam aos governos legitimidade. Quando as eleições são credíveis, livres e justas, podem ajudar no progresso da democracia, dos direitos humanos e da segurança. Mas, quando conduzidas sem integridade, as eleições podem enfraquecê-los.
Já testemunhamos várias vezes, por exemplo, como as eleições fraudulentas podem provocar instabilidade política e violência.
Mas as ameaças à integridade eleitoral não se limitam aos países pobres, divididos ou devastados pela guerra. A recessão global e a desigualdade têm pressionado as mais antigas democracias.
Os recentes acontecimentos na África do Norte e no Médio Oriente demonstram que as transições revolucionárias revelam oportunidades e obstáculos.
Simultaneamente, o aumento de um financiamento político descontrolado ameaça tirar todo o sentido à democracia em todo o mundo.
Em resposta a essas preocupações, um grupo de ex-líderes políticos e protagonistas proeminentes criaram a Comissão Global de Eleições, Democracia e Segurança.
O nosso relatório, "Aprofundar a Democracia", reforça a importância crucial das eleições com integridade para a democracia, a segurança e o desenvolvimento e identifica desafios que os os países deverão superar: são cinco.
Primeiramente, a necessidade de fortalecer o Estado de direito para que a justiça eleitoral e os direitos dos eleitores e dos candidatos possam ser protegidos.
Em segundo lugar, reforçamos a importância dos órgãos nacionais profissionais e independentes na gestão dos processos eleitorais, assegurando assim que estes sejam tecnicamente credíveis e que os resultados legítimos.
Em terceiro lugar, apelamos a um maior esforço na criação de instituições, processos e comportamentos necessários para assegurar a verdadeira competição multipartidária.
Em quarto lugar, sublinhamos que a integridade das eleições requer a igualdade política. As barreiras que impedem a votação e uma participação alargada na vida política das mulheres, das minorias e outros grupos marginalizados devem ser eliminadas.
E há, finalmente, o quinto desafio.
O financiamento político descontrolado e não regulado põe em risco a fé dos eleitores nas eleições, bem como a confiança na democracia -em países ricos e em países pobres.
Isso significa que certamente é preciso agir para impedir compra de votos e suborno dos candidatos, inclusive pelo crime organizado.
Mas significa também combater o crescimento explosivo das despesas das campanhas, que afetam a confiança na igualdade eleitoral.
Todos os cinco desafios são, naturalmente, políticos. Mas não podem ser combatidos apenas por políticos. Acreditamos que a sociedade civil e os meios de comunicação devem também aceitar a responsabilidade de estabelecer e defender eleições com integridade. A ação internacional e o financiamento devem apoiar a reforma democrática, em lugar de sustentar os regimes autoritários.
O nosso relatório define uma estratégia para reforçar a integridade das eleições. Apelamos para que os governos regulem doações e despesas políticas e requeiram total transparência, divulgando as doações e penalizando a não conformidade.
Recomendamos que as organizações que controlam as eleições em cada país se juntem para criar normas internacionais de profissionalismo, independência e competência. Propomos a criação de uma nova organização transnacional da sociedade civil para alertar para as irregularidades. A comunidade internacional deve definir os limites de abuso eleitoral extremo que levariam à condenação e à sanção.
Esse tipo de programa pode servir de catalizador a uma melhor governabilidade, a maior segurança e ao desenvolvimento humano.
KOFI ANNAN 74, é o presidente da Comissão Global de Eleições, Democracia e Segurança. Diplomata de Gana, foi secretário-geral da ONU (1997-2006)Da Folha de São Paulo de 05/10/2012
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