segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

O DESAFIO DA MATERNIDADE

"Amo meu filho, mas odeio ser mãe."
Após corrente na internet, mulheres ajudam a expor lado B da maternidade
"Amo meu filho, mas odeio ser mãe." Foi assim que a carioca Juliana Reis, 25, rejeitou o "Desafio da Maternidade", uma corrente lançada nas redes sociais que "desafiava" mães a publicarem fotos que mostrassem como é feliz a mulher que tem filhos.
Em vez disso, postou fotos amamentando, com ar exausto, seu filho, Vicente, hoje com dois meses.
         



Falou das dificuldades do início da vida materna -dor nos seios, cansaço- e lançou outro desafio: "Postem fotos de desconforto com a maternidade e relatem seus maiores medos ou suas piores experiências para que mais mulheres saibam da realidade que passamos", propôs.

O post teve 114 mil curtidas e recebeu críticas, mas também mensagens de apoio e desabafo. Em seguida, o perfil dela no Facebook foi denunciado e bloqueado -e reativado 12 horas depois.
O bloqueio fez sua história ganhar visibilidade, e outras mães se manifestaram na esteira do desafio real.
O espectro de realidades expostas foi de reclamações sobre falta de tempo a relatos de depressão pós-parto, passando pela chamada "baby blues" -tristeza que dura de quatro dias a duas semanas e que afeta cerca de 50% das mulheres.
A catarinense Natália Pinheiro, 25, foi uma das que se manifestaram a favor de Juliana. Feminista, diz achar importante questionar a romantização do instinto materno pois, para ela, ele coloca excessiva responsabilidade pela criação sobre a mãe.
"Se acho que sou feita para aquilo, sinto que a responsabilidade é mais minha."

TRÉPLICA
A campanha em prol da "maternidade real" gerou, por sua vez, reações contrárias. Algumas mães disseram que o sofrimento faz parte e que, quem não o aguenta, não deveria ter filhos. Outras afirmaram que o desafio original era apenas uma brincadeira que havia sido levada a sério demais.
Foi o caso de Mayara Dias, 25. "Eu aceitei o desafio e faria de novo. Gosto de ser mãe. Já passei por essa fase difícil do início da vida do bebê. Temos que falar dela também, mas sei que passa. Os prazeres que vêm depois compensam", afirma ela, que é mãe de dois.
Joel Rennó Jr., diretor do programa de saúde mental da mulher do Instituto de Psiquiatria da USP, diz que a tristeza e a depressão após o parto têm causas diversas, de
genética a sociais.
Segundo ele, algumas mulheres são mais sensíveis à queda hormonal que acontece depois do parto.
"Colocar um padrão único para esse período acaba gerando mais prejuízo do que benefício. Você cria a ditadura da felicidade. Gera a possibilidade de preconceito contra mães que não se sentem alegres, inicialmente, no período do pós-parto."
Rennó Jr. diz que a excessiva romantização da maternidade pode contribuir para a subnotificação de casos de transtornos psicológicos no período pós-parto.
"Mulheres de todos os níveis socioeconômicos procuram tratamento tarde porque não são aceitas pela sociedade ou pela família. Sofrem caladas, têm medo de serem crucificadas. Há pessoas que poderiam ter tido outro destino se tivessem sido encorajadas a procurar ajuda."
Ele pondera, no entanto, que não se pode exagerar o sofrimento. "O importante é não dramatizar nem ignorar. Não se pode colocar a questão como se todas as mães que passam por dificuldades fossem ter quadros de depressão."

Da Folha de São Paulo de 29/02/2016
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/02/1744480-apos-corrente-na-internet-mulheres-ajudam-a-expor-lado-b-da-maternidade.shtml

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Fundo do poço à vista

O poço tem fundo?
O Vinicius Torre Freire da Folha de São Paulo faz um resumo das projeções dos bancos sobre o Fundo do poço à vista
Os otimistas acreditam que o poço tem fundo 
Nós, os realistas, acreditamos que o poço não tem fundo
Só iremos cravar as unhas na parede do poço e tentar subir depois que o GOVERNO do país for substituído!

Em breve, vamos chegar ao fundo do poço. Lá embaixo, porém, é frio, úmido e há bichos peçonhentos. Enfim, vamos chegar lá, mas arrebentados do tombo.
Sim, entre alguns economistas relevantes começou a se dizer que o fim está próximo. Ou melhor, a economia pararia de encolher em meados do ano. É o que diz, por exemplo, o pessoal dos departamentos de pesquisa econômica do Bradesco, do Itaú e do Safra.
Isso quer dizer que vamos sair do buraco? Não. A opinião mediana dos economistas "do mercado" é que começaríamos a escalar as paredes do poço apenas em 2018.
"Fundo do poço" quer dizer que o desemprego vai parar de crescer? Não vai. O contrário.
"Fundo do poço" quer dizer que o PIB (a produção ou a renda da economia) para de encolher. No entanto, ao final deste ano, o PIB por cabeça deverá ser menor do que em meados de 2010. Uma economia menor em geral emprega menos gente, a não ser que ocorra alguma aberração feliz. É improvável.
Sair do buraco significa que o PIB per capita teria ultrapassado o nível de 2013, ano a partir do qual o país começou a decair, a empobrecer. Essa ultrapassagem deve ocorrer lá por 2021, segundo projeções hoje tidas como otimistas. É projeção, não é destino. Mas a tarefa é difícil.
Na sexta-feira, os economistas do Safra publicaram um relatório em que apresentam um método engenhoso de medir a aproximação do fundo do poço. De acordo com essas contas, o ritmo de piora do PIB, mês a mês, está para chegar a zero. O ano ainda seria negativo.
Mesmo assim, o Safra estima que a taxa de desemprego média do ano passaria dos 6,8% de 2015 para 9,7% neste 2016 e para 12,3% em 2017 (desemprego nas seis metrópoles mais importantes). Não difere muito da projeção do Itaú.
Quando se mede o desemprego nacional, apurado pela Pnad, do IBGE, a taxa passaria da média de 8,3% em 2015 para 11,5% neste ano e para 13,2% em 2017, na estimativa do Itaú. Para o pessoal do Bradesco, para 11,8% neste ano e, mais otimistas, 11,7% em 2017.
Ou seja, trata-se de um maldito fundo do poço. "Estamos em um nível extremamente deteriorado de atividade. Porém, não parece razoável supor quedas adicionais significativas. Em outras palavras, o exercício sugere que estamos próximos do 'fundo do poço'", diz em seu estudo o pessoal do Safra, chefiado pelo economista Carlos Kawall.
Os números oficiais de 2015 ainda não saíram, mas o PIB deve ter diminuído quase 4% em 2015. Neste 2016, o tamanho da economia ficaria menor ainda 3,2%, na mediana das estimativas da centena de economistas que informam suas projeções ao Banco Central, semanalmente. Para os economistas do Itaú, a economia ainda diminui 4% neste ano. Para os do Bradesco, 3,5%. Do Safra, 2,9%.
"É importante notar que, primeiro, atingir o fundo do poço não significa necessariamente que um cenário de recuperação seja iminente... Em segundo lugar, vale relembrar que este cenário é condicionado à ausência de surpresas negativas. Novos desenrolares no âmbito político, assim como novas decepções no campo fiscal e, em menor medida, surpresas advindas do cenário internacional podem voltar a impactar a confiança dos agentes", diz em suma o relatório do Safra.

Da Folha de São Paulo de 14/02/2016
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2016/02/1739382-fundo-do-poco-a-vista.shtml