segunda-feira, 13 de abril de 2015

China exigirá compensação pelo empréstimo de US$ 3,5 bi à Petrobras

China exigirá compensação pelo empréstimo de US$ 3,5 bi à Petrobras, dizem analistas
Segundo especialistas, foco serão obras de infraestrutura. Só em 2014, Brasil recebeu US$ 8,6 bilhões do país asiático

O empréstimo de US$ 3,5 bilhões do Banco de Desenvolvimento da China para a Petrobras, liberado recentemente, mostra que os chineses não estão brincando e querem ocupar um espaço maior do que já tem na América do Sul. Antes do Brasil, a Venezuela e a Argentina, países que passam por grave crise econômica, foram socorridos por Pequim.


Fontes do governo e especialistas em geral concordam que essa ajuda financeira não é de graça e especulam que a contrapartida exigida pela nação asiática são a realização de obras de infraestrutura com máquinas e equipamentos e trabalhadores do país asiático. No caso da Petrobras, a estatal pagaria o empréstimo comprando alguns equipamentos e fornecendo petróleo.

- As condições do empréstimo para a Petrobras não foram divulgadas, mas devem estar vinculadas ao fornecimento de petróleo e talvez de equipamentos - afirma Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e atual presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Para ele, quem mais perde com a crescente presença da China na América do Sul é o Brasil, por duas razões: a concorrência, cada vez mais forte, dos equipamentos chineses; e, do ponto de vista político-diplomático, a instalação de base militar na Argentina.

- O Brasil sempre se manifestou contra a instalação de bases militares em nossa região - completa Barbosa.

Estima-se que a China já emprestou mais de US$ 120 bilhões para a América do Sul e, por ordem decrescente, venezuelanos, argentinos e brasileiros são os maiores beneficiados. Somente em 2014, foram repassados US$ 12 bilhões para a região e a maior parte dos recursos, US$ 8,6 bilhões, veio para o Brasil.

Sobre a Argentina especificamente, os mais de US$ 10 bilhões emprestados recentemente serão compensados pela compra de máquinas e equipamentos chineses e a autorização de uma base militar de rastreamento de satélites e mísseis no país. Recentemente, a presidente argentina Cristina Kirchner esteve na China para assinar 22 acordos de uma aliança estratégica nas áreas de infraestrutura e energia. E, em janeiro último, os chineses anunciaram que iriam investir US$ 20 bilhões na Venezuela, conforme informou o presidente venezuelano Nicolás Maduro.

- A China é um país discreto, que procura trabalhar silenciosamente. A grande diferença em relação a outros países é que os chineses têm muito dinheiro. São os maiores credores do mundo e possuem reservas internacionais de US$ 4 trilhões - diz o pesquisador do Instituto de Relações Internacionais da PUC/Rio, Paulo Wrobel.

Segundo o professor de Relações Internacionais Cui Shoujun, da Universidade Renmin, em Pequim, a China vê a América Latina como parte de uma estratégia combinada de longo prazo que visa não só ao lucro, também à influência política na região. Esta estratégia ganhou força depois que o governo Lula fez da cooperação Sul-Sul prioridade. O fato de os latinos terem um histórico de notas de risco ruins não assusta. Muito menos as atuais denúncias de corrupção aqui no Brasil.

- Os países latinos podem estar em apuros agora, mas não necessariamente para sempre. E a corrupção é inevitável. O próprio governo chinês está no meio de uma campanha para erradicar a corrupção. Enquanto o governo brasileiro estiver adotando medidas positivas para combatê-la, as empresas chinesas vão ver no país novas oportunidades de ganhar mercado - disse.

O consultor internacional Nelson Franco Jobim reforça que a China tem as maiores reservas cambiais do mundo e um vasto fundo soberano usado para aquisições estratégicas e, principalmente, assegurar o fornecimento de matérias-primas essenciais a seu desenvolvimento. Isso orienta as relações com a África, a América Latina e o Oriente Médio.

- A China se aproveita da fragilidade de países como Brasil, Venezuela e até a Rússia. O acordo da China com a Argentina foi uma clara violação das regras do Mercosul, que cada vez mais se torna irrelevante - diz Jobim.

Leonardo Valente, professor de relações internacionais da UFRJ, lembra que nenhum empréstimo é de graça, nem os concedidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) ou pelas potências ocidentais, nem os concedidos pela China.

- Mas é extremamente positivo que o cenário internacional tenha uma maior diversidade de opções de credores, o que dá mais autonomia decisória aos países que precisam desses empréstimos. A China tem interesses estratégicos na América do Sul e estes dependem da estabilidade política e econômica da região - disse Valente.

Texto de Eliane Oliveira n'O Globo

http://oglobo.globo.com/economia/china-exigira-compensacao-pelo-emprestimo-de-us-35-bi-petrobras-dizem-analistas-15854557#ixzz3XCima7r8