Aprovado há seis anos, o novo Código Florestal começa a transformar a preservação do meio ambiente em dinheiro no bolso do produtor rural. Após um longo debate sobre a constitucionalidade e a validade de dispositivos da lei, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento em fevereiro e, agora, finalmente alguns instrumentos para compensar financeiramente quem preserva, começam a ser adotados em maior escala.
Entre os instrumentos, estão o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), as Cotas de Reserva Ambiental (CRAs) e os títulos verdes. Todos eles se tornaram possíveis graças ao Cadastro mbiental Rural (CAR), que deve ser encerrado em dezembro.
Até o dia 8 deste mês, por exemplo, donos de reservas particulares com planos de manejo no Paraná podem se inscrever no edital do PSA e pleitear valores que vão de R$ 10 mil a R$ 50 mil por ano. “Todos os Estados passam por dificuldades e o Paraná não é diferente, mas os proprietários que voluntariamente têm o ônus da preservação merecem ser premiados”, diz Sueli Ota, coordenadora de biodiversidade e florestas da Secretaria de Meio Ambiente daquele Estado. O recurso de R$ 1,2 milhão, proveniente do Fundo Estadual do Meio Ambiente, será destinado também ao monitoramento e à orientação dos proprietários por um grupo técnico, criado especificamente para o projeto.
Apesar de a verba pública ser quase simbólica – e ainda restrita a poucos Estados e municípios –, os donos de terras beneficiados podem, ao mesmo tempo, fazer parte de outro mercado mais atraente: o das cotas de reserva. Títulos a serem negociados em Bolsa, são emitidos por quem tem mais reservas florestais do que exige a lei. Quem tem menos, compra esses papéis e compensa o passivo ambiental. “É o custo mais eficiente para quem tem déficit de áreas preservadas regularizar sua situação: não é necessário abrir mão de áreas produtivas e ainda é possível ajudar uma região a ser preservada”, diz Plínio Ribeiro, presidente da Biofílica Investimentos Ambientais, especializada na gestão e conservação de florestas. Além das cotas, os produtores com déficits de reservas podem investir em sua restauração.
Demanda
Segundo Ribeiro, o passivo ambiental das propriedades rurais hoje no País gira em torno de 20 a 25 milhões de hectares. Com o encerramento do CAR, a lei exige que os produtores rurais compensem seus déficits ambientais, e a demanda pelas cotas tem crescido. Grandes frigoríficos e usinas, por exemplo, têm tirado de sua carteira fornecedores que não ajustaram sua conduta. O mesmo acontece com os bancos, que já exigem o CAR como condicionante ao crédito rural e prometem limitá-lo a quem estiver ambientalmente irregular.
Para alguns especialistas, porém, uma decisão do STF sobre o tema pode atrapalhar o andamento desse mercado. “O tribunal entendeu que as cotas podem compensar ambientalmente áreas degradadas se forem equivalente em tamanho e estiverem no mesmo bioma, mas menciona também a necessidade de terem a mesma identidade ecológica”, afirma Rafaela Parra, advogada da VBSO e especialista no tema. Um pequeno detalhe: ninguém sabe o que é identidade ecológica. “Já foram feitos encontros de pesquisadores e estudos técnicos, mas ninguém sabe o que é isso e esse instrumento foi enfraquecido.”
Para João Adrien, diretor executivo da Sociedade Rural Brasileira, que atuou para o estabelecimento de regras da compensação ambiental, estão sendo buscadas outras alternativas para se reverter esse entendimento.
Ribeiro acredita que a identidade ecológica será encarada como o bioma, com o qual técnicos e mercado estão acostumados. Sua percepção de que o sistema continuará andando vem do fato de a Biolífica, que recebeu aporte de R$ 7 milhões de três fundos de investimento desde que foi criada, triplicou de tamanho a cada ano, nos últimos três anos. Com 2,5 milhões de hectares de floresta como lastro em seu estoque, os negócios têm crescido. A empresa publica mensalmente um boletim de quanto valem os títulos ao proprietário, em cada bioma, segundo a oferta e a demanda.
Na Mata Atlântica, um contrato de arrendamento vale em média R$ 270 por hectare por ano. Em São Paulo, chegam a R$ 400. No bioma da Amazônia, R$ 170, sendo que em Roraima vai a R$ 190. “Uma área que só significa custo ao produtor hoje vai gerar renda equivalente ao da criação de gado, por exemplo”, diz ele.
Títulos verdes. Mais consolidados no mercado agrícola, os títulos verdes, agora ligados ao meio ambiente, também têm crescido. Para ficar apenas num exemplo, no início do ano, a Fibria emitiu um título de R$ 700 milhões para a preservação de florestas nativas em torno de sua fábrica em Jacareí e no manejo sustentável de sua fazenda em São José dos Campos, bem como de resíduos, uso eficiente de água e energia sustentável.
Segundo a Climate Bonds Initiative, entidade que estimula o mercado de capitais para soluções de mudanças climáticas, entre 2015 e 2017, o Brasil emitiu nove títulos verdes, que somaram US$ 3,67 bilhões. A grande maioria era ligada a projetos de energia e não ao agronegócio.
Reportagem de Cristiane Barbieri no Estadão
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