Para o governo, ditadura no lombo dos outros é refresco
Dizem que não aceitarão uma ditadura de toga, mas uma militar está de buenas
Ditadura no lombo dos outros é refresco. Resumo da reação bolsonarista à operação que apreendeu computadores e celulares de blogueiros, empresários e parlamentares da extrema direita. A cara de pau não fica nem vermelha quando recorrem a princípios democráticos para defender sua agenda golpista.
Dizem que não aceitarão uma ditadura de toga, mas uma militar está de buenas, visto que não arredam o pé da Esplanada, com pedidos de intervenção, de golpe, de prisão de todos que enxergam como inimigos.
O sonho do "cabo e o soldado".
Os mesmíssimos que aplaudiram a devassa de Wilson Witzel posam de indignados diante do mesmo expediente contra seus aliados. Dizem que a ação desta quarta (27) é ilegal (pode ser que seja) e, adivinhe, inconstitucional, referindo-se àquela Constituição que gostariam de reescrever.
Alegam que esse é mais um capítulo de um golpe em curso para impichar Bolsonaro, um presidente "democraticamente" eleito, mas adorariam derrubar parlamentares que chegaram a seus cargos da mesma forma.
Gritam que sua liberdade de expressão é usurpada, mas se valem de todos os instrumentos usados para asfixiar democracias: mentiras, manipulação, perseguição, violência, ameaças, assédio, intolerância.
E, claro, recorrem à "liberdade de imprensa" para se defender (como se fake news fosse jornalismo), ao mesmo tempo em que fazem campanha para o cancelamento de assinatura de jornais, corte de verbas publicitárias, ameaçam e caluniam jornalistas. Tudinho como previsto nos manuais antidemocráticos.
Reclamam do aparelhamento do Estado pelos governos petistas, mas aplaudem a sanha presidencial de transformar instituições independentes e democráticas em puxadinhos do condomínio Vivendas da Barra.
Com PGR, com PF, logo mais com Supremo, com tudo. Aos amigos, a Constituição, aos inimigos, o pau de arara.
Mariliz Pereira Jorge, jornalista e roteirista de TV na Folha de São Paulo de 28/05/2020
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marilizpereirajorge/2020/05/para-o-governo-ditadura-no-lombo-dos-outros-e-refresco.shtml
quinta-feira, 28 de maio de 2020
O bolsochavismo e a receita venezuelana
A conduta política de Bolsonaro evidencia que ele está seguindo a cartilha bolivariana
Ninguém se torna ditador de um dia para o outro. Em primeiro lugar, precisa desacreditar o regime democrático e o sistema representativo. Depois de insuflar as massas insatisfeitas contra a democracia e os representantes eleitos, o líder populista procura demolir as instituições e tudo o mais que impõe limites entre a sua vontade e a submissão do povo ao seu desejo de poder absoluto, transmutado em mito. O terceiro passo é angariar recursos de poder, apoio financeiro de setores das classes dominantes, e armar seus seguidores. Tudo isso em nome da liberdade do povo, supostamente usurpada por autoridades legitimamente constituídas.
Jair Bolsonaro costuma citar a Venezuela como o perfil preferido de seus adversários dentro e fora do País. As evidências de sua conduta política mostram, entretanto, que ele está, ao contrário, seguindo a cartilha bolivariana com certa persistência.
É longa a transmutação de um líder político, eleito por voto popular, em figura mítica onipotente. Hugo Chávez, depois do fracasso de sua tentativa de golpe armado, deu um primeiro grande passo revogando a Constituição venezuelana e adotando uma Constituinte unilateral. Sua tarefa foi facilitada pelo boicote de uma oposição moderada muito fragmentada, a tal ponto que boicotou as eleições. Uma situação muito similar à que se observou entre nós quando, mesmo diante da radicalização política dos extremistas, as forças democráticas moderadas nem sequer tentaram se unir contra a ameaça comum.
Seguiram-se a manipulação populista da economia, a cooptação das Forças Armadas e do setor produtivo, em grande parte estatizado e majoritariamente corrupto, e a manipulação do câmbio para beneficiar as elites. Apesar disso, e incapaz de se unir, o pouco que restou da oposição não podia ser tolerado e Hugo Chávez reinventou a Corte Suprema de Justiça, impondo-lhe a missão de servir, acima de tudo, à “revolução” bolivariana.
O passo decisivo da ditadura chavista foi dado pela criação, em 2009, de milícias armadas, a Guardia Civil Bolivariana, encarregada da defesa contra a crescente organização das oposições e neste ano transformada em braço oficial das Forças Armadas.
Diferentemente das organizações militares tradicionais, as milícias são organizadas em grupos armados dentro de empresas e repartições e em comunidades de residência. São principalmente essas milícias, e não as Forças Armadas, que efetuam a repressão às manifestações, os sequestros, as execuções, a invasão e ocupação da Assembleia Nacional, tudo praticado em nome do socialismo e da liberdade.
A opinião pública brasileira e o debate político estiveram, nos últimos dias, estupefatos pelo conteúdo perturbador de uma reunião entre as mais altas autoridades do País. Mas o que essa reunião põe a nu de mais relevante não é a suposta interferência de Bolsonaro em instituições de investigação e inteligência. É, sim, o propósito anunciado do presidente de armar o povo para que o cidadão comum ameace, com armas de fogo, as autoridades constituídas quando delas discordarem.
Nas palavras do presidente, ouve-se: “Eu peço ao Fernando e ao Moro que, por favor, assine essa portaria hoje que eu quero dar um p..a de um recado pra esses b...a. Por quê que eu estou armando o povo” - sendo esses b...as governadores e prefeitos que não lhe agradam. Não se trata de um caso isolado. Os insultos ao Parlamento e ao Judiciário estão presentes desde a campanha eleitoral, tornaram-se pauta normal do presidente desde o fim de 2019 e, agora, agenda dominical do primeiro mandatário e de seu Ministério.
Em maio de 2019 Bolsonaro deu um passo nas pegadas de Chávez ao propor um pacto com os demais Poderes da República, convidando o Judiciário a colaborar com as agendas de governo, reiterando que era bom ter a Justiça a seu lado, quando o que cabe a ela é estar do lado da lei. Mais significativamente, na sequência da proposta de pacto, após criticar o Supremo Tribunal Federal por decisões supostamente contrárias às suas convicções políticas e religiosas, prometeu nomear para a Suprema Corte um evangélico, porque o Estado pode ser laico, “mas”, ressaltou, “eu sou cristão”.
Faltava, até agora, o modelo de mobilização de fiéis seguidores, que substituiu o voto popular, para manter no poder o sucessor de Chávez, derrotado nas eleições para a Assembleia Nacional. Trata-se das milícias bolivarianas, que o mantêm no poder mediante ataques armados às manifestações populares, praticam sequestros e execuções e invadem e ocupam o Parlamento.
Não é à toa que a opinião nacional e o Congresso têm reagido contra as tentativas do presidente de anular todas as cautelas e restrições ao acesso universal indiscriminado a armas letais, sob o pretexto de garantir a segurança dos indivíduos e de suas propriedades. Por trás dessa agenda existe, como esclarece o próprio Bolsonaro, uma agenda, até agora oculta, de armar seus fiéis seguidores para que possam resistir com armas na mão contra autoridades públicas que ousarem contrariar seus desejos e interesses.
Texto de José Serra, Senador por São Paulo n'O Estado de S.Paulo de 28 de maio de 2020 https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,receita-venezuelana,70003316872
Ninguém se torna ditador de um dia para o outro. Em primeiro lugar, precisa desacreditar o regime democrático e o sistema representativo. Depois de insuflar as massas insatisfeitas contra a democracia e os representantes eleitos, o líder populista procura demolir as instituições e tudo o mais que impõe limites entre a sua vontade e a submissão do povo ao seu desejo de poder absoluto, transmutado em mito. O terceiro passo é angariar recursos de poder, apoio financeiro de setores das classes dominantes, e armar seus seguidores. Tudo isso em nome da liberdade do povo, supostamente usurpada por autoridades legitimamente constituídas.
Jair Bolsonaro costuma citar a Venezuela como o perfil preferido de seus adversários dentro e fora do País. As evidências de sua conduta política mostram, entretanto, que ele está, ao contrário, seguindo a cartilha bolivariana com certa persistência.
É longa a transmutação de um líder político, eleito por voto popular, em figura mítica onipotente. Hugo Chávez, depois do fracasso de sua tentativa de golpe armado, deu um primeiro grande passo revogando a Constituição venezuelana e adotando uma Constituinte unilateral. Sua tarefa foi facilitada pelo boicote de uma oposição moderada muito fragmentada, a tal ponto que boicotou as eleições. Uma situação muito similar à que se observou entre nós quando, mesmo diante da radicalização política dos extremistas, as forças democráticas moderadas nem sequer tentaram se unir contra a ameaça comum.
Seguiram-se a manipulação populista da economia, a cooptação das Forças Armadas e do setor produtivo, em grande parte estatizado e majoritariamente corrupto, e a manipulação do câmbio para beneficiar as elites. Apesar disso, e incapaz de se unir, o pouco que restou da oposição não podia ser tolerado e Hugo Chávez reinventou a Corte Suprema de Justiça, impondo-lhe a missão de servir, acima de tudo, à “revolução” bolivariana.
O passo decisivo da ditadura chavista foi dado pela criação, em 2009, de milícias armadas, a Guardia Civil Bolivariana, encarregada da defesa contra a crescente organização das oposições e neste ano transformada em braço oficial das Forças Armadas.
Diferentemente das organizações militares tradicionais, as milícias são organizadas em grupos armados dentro de empresas e repartições e em comunidades de residência. São principalmente essas milícias, e não as Forças Armadas, que efetuam a repressão às manifestações, os sequestros, as execuções, a invasão e ocupação da Assembleia Nacional, tudo praticado em nome do socialismo e da liberdade.
A opinião pública brasileira e o debate político estiveram, nos últimos dias, estupefatos pelo conteúdo perturbador de uma reunião entre as mais altas autoridades do País. Mas o que essa reunião põe a nu de mais relevante não é a suposta interferência de Bolsonaro em instituições de investigação e inteligência. É, sim, o propósito anunciado do presidente de armar o povo para que o cidadão comum ameace, com armas de fogo, as autoridades constituídas quando delas discordarem.
Nas palavras do presidente, ouve-se: “Eu peço ao Fernando e ao Moro que, por favor, assine essa portaria hoje que eu quero dar um p..a de um recado pra esses b...a. Por quê que eu estou armando o povo” - sendo esses b...as governadores e prefeitos que não lhe agradam. Não se trata de um caso isolado. Os insultos ao Parlamento e ao Judiciário estão presentes desde a campanha eleitoral, tornaram-se pauta normal do presidente desde o fim de 2019 e, agora, agenda dominical do primeiro mandatário e de seu Ministério.
Em maio de 2019 Bolsonaro deu um passo nas pegadas de Chávez ao propor um pacto com os demais Poderes da República, convidando o Judiciário a colaborar com as agendas de governo, reiterando que era bom ter a Justiça a seu lado, quando o que cabe a ela é estar do lado da lei. Mais significativamente, na sequência da proposta de pacto, após criticar o Supremo Tribunal Federal por decisões supostamente contrárias às suas convicções políticas e religiosas, prometeu nomear para a Suprema Corte um evangélico, porque o Estado pode ser laico, “mas”, ressaltou, “eu sou cristão”.
Faltava, até agora, o modelo de mobilização de fiéis seguidores, que substituiu o voto popular, para manter no poder o sucessor de Chávez, derrotado nas eleições para a Assembleia Nacional. Trata-se das milícias bolivarianas, que o mantêm no poder mediante ataques armados às manifestações populares, praticam sequestros e execuções e invadem e ocupam o Parlamento.
Não é à toa que a opinião nacional e o Congresso têm reagido contra as tentativas do presidente de anular todas as cautelas e restrições ao acesso universal indiscriminado a armas letais, sob o pretexto de garantir a segurança dos indivíduos e de suas propriedades. Por trás dessa agenda existe, como esclarece o próprio Bolsonaro, uma agenda, até agora oculta, de armar seus fiéis seguidores para que possam resistir com armas na mão contra autoridades públicas que ousarem contrariar seus desejos e interesses.
Texto de José Serra, Senador por São Paulo n'O Estado de S.Paulo de 28 de maio de 2020 https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,receita-venezuelana,70003316872
domingo, 24 de maio de 2020
Brasil pode assumir a humilhante liderança mundial em óbitos
Drauzio Varella escreve
No auge da maior crise sanitária do último século, assistimos à negação da realidade pelas autoridades federais
Fui otimista quando ouvi falar da epidemia que se espalhava na região de Wuhan, na China.
Em dezembro do ano passado, as notícias eram de que surgira um novo coronavírus, causador de infecção assintomática ou sintomas gripais de curta duração na maioria das pessoas infectadas. A mortalidade ficaria restrita aos mais velhos: chegaria a 14,8% naqueles com mais de 80 anos. Abaixo dos 40 anos morreriam duas pessoas em cada mil infectadas. Era esse o panorama acessível a quem estava do outro lado do mundo.
Há muito sabemos que os coronavírus são agentes causadores de resfriados comuns. Apenas dois deles estão associados a doenças mais graves, como a Sars e a Mers, epidemias que emergiram na China em 2003, e na Arábia Saudita em 2012, respectivamente, para desaparecer misteriosamente depois de atingir alguns países.
Fui entender a gravidade da Covid-19 nos primeiros dias de fevereiro, quando colegas italianos começaram a enviar vídeos que mostravam o inferno instalado nas unidades de terapia intensiva daquele país.
Cientistas de renome e especialistas em saúde pública se enganaram como eu, entre os quais recipientes do Nobel de Medicina e o doutor Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, o NIAID, dos Estados Unidos, cuja carreira acompanho desde o início da epidemia de Aids.
Na verdade, o mundo não foi capaz de avaliar o perigo que vinha da Ásia. A Europa foi pega de surpresa. Os italianos levaram semanas para entender o que se passava, os britânicos também, os suecos mantiveram a população nas ruas, os espanhóis autorizaram uma passeata para comemorar o Dia Internacional da Mulher, que aglomerou 200 mil pessoas no centro de Madri, justo no dia em que a Itália decretava o isolamento social nas cidades do norte.
Os Estados Unidos —que investem em saúde perto de 20% do maior PIB do mundo— assistiram à chegada do coronavírus em Nova York, com hospitais sem leitos suficientes nem máscaras cirúrgicas para atender à demanda dos profissionais de saúde. Para disfarçar a incompetência em adotar medidas antecipatórias, hoje o presidente americano joga a culpa na Organização Mundial da Saúde.
Aqui, logo que o primeiro brasileiro caiu doente, no último dia de fevereiro, ficou claro que o vírus já andava longe demais para ser contido. A julgar pelo que acontecera em outros países, era esperado que centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, se tornassem epicentros da epidemia, mas que a doença chegasse ao mesmo tempo a Manaus, Macapá, Fortaleza e Recife, separadas por milhares de quilômetros, foi surpreendente.
Embora pelo menos 80% dos infectados tenham evolução benigna, aqueles com apresentações mais agressivas que exigem internação em leitos hospitalares e UTIs, provocaram um estresse no sistema, que nem o SUS nem os planos de saúde estavam preparados para suportar.
O drama dos hospitais superlotados no Norte do país, Rio de Janeiro, Fortaleza e Recife será repetido em outras capitais e em cidades menores à medida que a epidemia se interioriza. Se o vírus viajou da China para cá em três meses, há alguma razão para ficar aprisionado nas cidades grandes?
Décadas de descaso com a saúde inviabilizaram a agilidade das respostas, para enfrentar o desafio de impedir que o Brasil assuma a humilhante liderança mundial na contagem do número de óbitos, tragédia considerada possível, e até provável, por epidemiologistas respeitados.
No auge da maior crise sanitária dos últimos cem anos, assistimos à inacreditável negação da realidade por parte das autoridades federais, a quem caberia a responsabilidade inalienável de coordenar e dar sentido ao esforço nacional. Inexplicavelmente, o governo se exime até de reconhecer a gravidade do mal que aflige todos, especialmente os que perderam —e ainda perderão— familiares e pessoas queridas.
O Brasil caiu numa armadilha sinistra. Duas trocas de ministros numa fase crucial da disseminação da epidemia mantêm o Ministério da Saúde de mãos atadas há mais de um mês, enquanto o presidente faz o diabo para acabar com o isolamento social e impor um medicamento inútil, com efeitos colaterais eventualmente graves. Por que essa obstinação? Para dar a ilusão de que existe cura para quem contrair a doença nas ruas?
A situação em que estamos, não poderia ser imaginada nem sequer no mais terrível pesadelo.
Texto de Drauzio Varella, médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru” na Folha de São Paulo de 24/05/2020 https://www1.folha.uol.com.br/colunas/drauziovarella/2020/05/brasil-pode-assumir-a-humilhante-lideranca-mundial-em-obitos.shtml
No auge da maior crise sanitária do último século, assistimos à negação da realidade pelas autoridades federais
Fui otimista quando ouvi falar da epidemia que se espalhava na região de Wuhan, na China.
Em dezembro do ano passado, as notícias eram de que surgira um novo coronavírus, causador de infecção assintomática ou sintomas gripais de curta duração na maioria das pessoas infectadas. A mortalidade ficaria restrita aos mais velhos: chegaria a 14,8% naqueles com mais de 80 anos. Abaixo dos 40 anos morreriam duas pessoas em cada mil infectadas. Era esse o panorama acessível a quem estava do outro lado do mundo.
Há muito sabemos que os coronavírus são agentes causadores de resfriados comuns. Apenas dois deles estão associados a doenças mais graves, como a Sars e a Mers, epidemias que emergiram na China em 2003, e na Arábia Saudita em 2012, respectivamente, para desaparecer misteriosamente depois de atingir alguns países.
Fui entender a gravidade da Covid-19 nos primeiros dias de fevereiro, quando colegas italianos começaram a enviar vídeos que mostravam o inferno instalado nas unidades de terapia intensiva daquele país.
Cientistas de renome e especialistas em saúde pública se enganaram como eu, entre os quais recipientes do Nobel de Medicina e o doutor Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, o NIAID, dos Estados Unidos, cuja carreira acompanho desde o início da epidemia de Aids.
Na verdade, o mundo não foi capaz de avaliar o perigo que vinha da Ásia. A Europa foi pega de surpresa. Os italianos levaram semanas para entender o que se passava, os britânicos também, os suecos mantiveram a população nas ruas, os espanhóis autorizaram uma passeata para comemorar o Dia Internacional da Mulher, que aglomerou 200 mil pessoas no centro de Madri, justo no dia em que a Itália decretava o isolamento social nas cidades do norte.
Os Estados Unidos —que investem em saúde perto de 20% do maior PIB do mundo— assistiram à chegada do coronavírus em Nova York, com hospitais sem leitos suficientes nem máscaras cirúrgicas para atender à demanda dos profissionais de saúde. Para disfarçar a incompetência em adotar medidas antecipatórias, hoje o presidente americano joga a culpa na Organização Mundial da Saúde.
Aqui, logo que o primeiro brasileiro caiu doente, no último dia de fevereiro, ficou claro que o vírus já andava longe demais para ser contido. A julgar pelo que acontecera em outros países, era esperado que centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, se tornassem epicentros da epidemia, mas que a doença chegasse ao mesmo tempo a Manaus, Macapá, Fortaleza e Recife, separadas por milhares de quilômetros, foi surpreendente.
Embora pelo menos 80% dos infectados tenham evolução benigna, aqueles com apresentações mais agressivas que exigem internação em leitos hospitalares e UTIs, provocaram um estresse no sistema, que nem o SUS nem os planos de saúde estavam preparados para suportar.
O drama dos hospitais superlotados no Norte do país, Rio de Janeiro, Fortaleza e Recife será repetido em outras capitais e em cidades menores à medida que a epidemia se interioriza. Se o vírus viajou da China para cá em três meses, há alguma razão para ficar aprisionado nas cidades grandes?
Décadas de descaso com a saúde inviabilizaram a agilidade das respostas, para enfrentar o desafio de impedir que o Brasil assuma a humilhante liderança mundial na contagem do número de óbitos, tragédia considerada possível, e até provável, por epidemiologistas respeitados.
No auge da maior crise sanitária dos últimos cem anos, assistimos à inacreditável negação da realidade por parte das autoridades federais, a quem caberia a responsabilidade inalienável de coordenar e dar sentido ao esforço nacional. Inexplicavelmente, o governo se exime até de reconhecer a gravidade do mal que aflige todos, especialmente os que perderam —e ainda perderão— familiares e pessoas queridas.
O Brasil caiu numa armadilha sinistra. Duas trocas de ministros numa fase crucial da disseminação da epidemia mantêm o Ministério da Saúde de mãos atadas há mais de um mês, enquanto o presidente faz o diabo para acabar com o isolamento social e impor um medicamento inútil, com efeitos colaterais eventualmente graves. Por que essa obstinação? Para dar a ilusão de que existe cura para quem contrair a doença nas ruas?
A situação em que estamos, não poderia ser imaginada nem sequer no mais terrível pesadelo.
Texto de Drauzio Varella, médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru” na Folha de São Paulo de 24/05/2020 https://www1.folha.uol.com.br/colunas/drauziovarella/2020/05/brasil-pode-assumir-a-humilhante-lideranca-mundial-em-obitos.shtml
segunda-feira, 11 de maio de 2020
Vemos cada vez mais AVCs ligados à covid-19
“Vemos cada vez mais AVCs ligados à covid-19”, diz Paulo Niemeyer Filho
Para amenizar o risco do coronavírus, no Rio, a Rede D’or isolou dois hospitais – os ‘corona free’– onde não se interna pacientes infectados e funcionários são testados rigidamente. “Isso dá mais segurança para continuar tratando quem tem outras doenças e é onde eu tenho operado”, contou à coluna, por celular, Paulo Niemeyer Filho.
Um dos melhores neurocirurgiões do Brasil conta que pesquisas recentes de laboratório mostram que o coronavírus pode penetrar nos neurônios – mas ainda não está sendo visto nos pacientes. “O que vemos cada vez mais são os acidentes vasculares cerebrais, os AVCs, associados à covid-19. Não apenas em idosos, mas também em pacientes jovens e, muitas vezes, como primeira manifestação da doença. Isso se deve aos distúrbios da coagulação causados pelo vírus, que lesam as paredes das artérias, desencadeando o processo de trombose”, conta o médico que faz parte da comissão de especialistas e economistas – como Armínio Fraga – criada pelo governador Witzel, para avaliar a adesão ao isolamento testes e vacinas e plano de saída controlada da quarentena.
Melhores momentos da conversa.
Como foi essa transformação do Instituto Estadual do Cérebro em hospital de covid-19?
Ele continua sendo do cérebro, mas atendendo pedido da secretaria de Saúde, do estado do Rio, suspendemos cirurgias e colocamos 44 leitos de UTI e equipe de intensivistas e fisioterapeutas à disposição de pacientes com covid-19.
O hospital continua funcionando para outras doenças?
Com exceção do centro cirúrgico, todos os demais setores tratam epilepsia, doenças endovascular. Ambulatórios também continuam atendendo normalmente.
Vocês foram os primeiros a iniciar o tratamento de transfusão de plasma com anticorpos de quem sarou da covid-19.
Qual resultado?
Só atendemos casos graves e como iniciamos os testes há duas semanas, ainda é cedo para avaliar. Entretanto, a transfusão de anticorpos parece ser, até agora, o que faz mais sentido. Idealmente, deve ser tentado logo no inicio da doença, para evitar sua progressão. Temos que nos guiar pelos exames de sangue, acompanhando os marcadores inflamatórios, a carga viral e outros parâmetros. Estamos esperançosos.
O custo é alto?
A transfusão de plasma não é novidade, é um procedimento corrente nas UTIs, não para transmissão de anticorpos, mas para transmissão de elementos da coagulação, por exemplo. A transfusão de anticorpos também não é nova, já foi usada na pandemia da Gripe Espanhola, em 1918, e em outras epidemias mais recentes. Apesar de publicações da época relatarem redução da mortalidade, esse tratamento, por ser feito sempre em crises, nunca foi avaliado com rigor científico e, por isso, ainda é considerado experimental, necessitando de aprovação da Anvisa.
Outros hospitais estão fazendo o mesmo no Brasil?
Se não começaram, devem estar se preparando para isso. Os grandes hospitais dos EUA também estão fazendo e todos procurando identificar os grupos de pacientes que podem se beneficiar. Qual o bom doente, o bom momento e a boa dose. Serão os mais idosos ou aqueles que têm uma carga viral mais elevada? Os trabalhos antigos sugerem melhor resultado se os anticorpos forem transfundidos precocemente, ao início da doença, tentando evitar o comprometimento pulmonar, a entubação, e os distúrbios da coagulação.
O que a covid-19 tem de diferente de outros vírus?
Primeiro, a rapidez com que se propaga. Depois, ele não tem um padrão, podendo se manifestar de várias formas, como se fossem várias doenças diferentes. Muitos são assintomáticos. Outros perdem o olfato e, consequentemente, o paladar, acompanhado de uma gripe leve, que evolui bem. Por fim, há aqueles que preocupam, em geral obesos ou portadores de outras doenças crônicas, que podem apresentar comprometimento pulmonar e necessitar de UTI e entubação. É como se fossem variações do mesmo vírus ou características genéticas de cada indivíduo, que vão determinar a evolução da doença.
Isso o surpreende?
Não. Vimos isso na epidemia da AIDS, algumas pessoas simplesmente não pegavam. Em alguns casais, apenas um dos cônjuges se infectava. O mesmo se passa agora com a covid-19. Então há aspectos individuais, talvez genéticos, que fazem a diferença, e há muito ainda a ser entendido.
O que de fato o coronavírus faz com o pulmão? As pessoas se recuperam?
Além da inflamação, esses pacientes apresentam distúrbios variáveis da coagulação, que produzem vários microinfartos no pulmão. Aqueles que se recuperam, portanto, podem perder um pouco da sua capacidade pulmonar.
Existe também algum efeito desse vírus no cérebro?
Pesquisas recentes de laboratório mostram que o vírus pode penetrar nos neurônios, mas isso, entretanto, ainda não é visto nos pacientes. O que vemos cada vez mais são os acidentes vasculares cerebrais, conhecidos AVCs, associados à covid-19.
Isso ocorre apenas no cérebro?
Não, em todo o corpo. O que pode resultar também em isquemia de qualquer outro órgão ou mesmo das extremidades, braços e pernas. O distúrbio de coagulação ocorre em praticamente todos os casos. Parece fazer parte da doença, é considerado como uma das principais causas da lesão pulmonar e da falência respiratória. Todos os doentes, hoje, internados, com covid-19, estão tomando anticoagulantes, em doses maiores ou menores, dependendo dos exames.
Como é que a pessoa chega no Instituto Estadual do Cérebro?
Recebemos apenas pacientes do SUS, mas não é um hospital aberto. As vagas são reguladas pela Secretaria Estadual de Saúde, que encaminha os pacientes que se encontram nas UPAS, ou em outros hospitais, e que preencham os requisitos. São, em geral, pacientes em estado grave, com insuficiência respiratória, já entubados ou precisando entubar.
E desses casos graves, quantos se recuperam?
Nosso primeiro doente foi internado há 40 dias, aproximadamente, e só agora ele está curando. Até agora, nossa mortalidade tem sido em torno de 25% dos doentes entubados, quase todos acima de 60 anos. Entre os não entubados, a mortalidade foi zero. Observamos também que a obesidade é o fator de risco mais importante para os pacientes jovens.
A contaminação no Instituto está alta?
A contaminação entre funcionários de saúde é elevada, e em nosso hospital chega a 50%. Isso inclui médicos, enfermeiros, pessoal da limpeza, enfim, todos. Diariamente testamos aqueles que apresentam algum sintoma, e a metade testa positivo. Estes são afastados temporariamente e substituídos.
Agora um tema polêmico, o que acha da cloroquina?
Não se mostrou eficaz, em nossos casos. Suspendemos seu uso por causa das graves arritmias cardíacas que esses pacientes apresentavam, sem nenhuma evidência de melhora.
Quanto ao teste da covid-19 pelo nariz é, de fato, seguro?
Quando ele é positivo ele é seguro, sim, mas quando é negativo tem uma margem de erro de quase 40%. Ou seja, você pode testar negativo e estar contaminado.
Pelo que tem visto, há possibilidade de mutação desse vírus?
Certamente. Pode, inclusive, já haver alguma mutação, e isso explicaria porque alguns casos são mais simples e outros são tão graves. É possível que no próximo ano ele volte mudado, mas com menos força. Teríamos, então, que fazer vacinações anuais, como já se faz para as gripes por Influenza.
Tem que sair uma vacina para a cura, então…
Essa parece ser a única solução. Outra possibilidade de controle seria quando alcançássemos a chamada imunidade de rebanho, que é quando 70% da população já teve contato com o vírus e adquiriu anticorpos.
Sobre o SUS, muita gente está elogiando ante a pandemia. Qual sua opinião?
O SUS foi a coisa mais importante que já se fez no país. Nunca houve um movimento de inclusão social tão grande, no mundo, como o que resultou da criação do SUS. Milhões de brasileiros que se encontravam à margem do serviço social, sem direito a nada, foram incorporados. Acho que está claro a todos que o SUS está sendo fundamental nessa crise e que sairá fortalecido, valorizado.
E o que falta para o SUS? Recursos?
Acho que para melhorar precisaria de mais recursos e de gestão moderna e pragmática.
Sobre a quarentena, já estamos há dois meses em isolamento social, o senhor é a favor?
Sim. O isolamento é um recurso bíblico. Já era utilizado na antiguidade, quando não havia tratamento para hanseníase. Acho que não há outra maneira de conter uma doença infecciosa, para a qual não há tratamento. Agora, como todo remédio, tem seus efeitos colaterais, é preciso saber o momento de reduzir a dose.
Como imagina o mundo pós-coronavírus?
De imediato, teremos 230 milhões de infectologistas no País. Talvez o mundo fique mais humanizado, com as pessoas valorizando a presença e o contato físico. Ainda assim, a crise alavancou a vida virtual, seja social e profissional, de maneira irreversível.
Reportagem de Sonia Racy n'O Estado de São Paulo de 11 de maio de 2020
https://cultura.estadao.com.br/blogs/direto-da-fonte/vemos-cada-vez-mais-avcs-ligados-a-covid-19-diz-paulo-niemeyer-filho/
Para amenizar o risco do coronavírus, no Rio, a Rede D’or isolou dois hospitais – os ‘corona free’– onde não se interna pacientes infectados e funcionários são testados rigidamente. “Isso dá mais segurança para continuar tratando quem tem outras doenças e é onde eu tenho operado”, contou à coluna, por celular, Paulo Niemeyer Filho.
Um dos melhores neurocirurgiões do Brasil conta que pesquisas recentes de laboratório mostram que o coronavírus pode penetrar nos neurônios – mas ainda não está sendo visto nos pacientes. “O que vemos cada vez mais são os acidentes vasculares cerebrais, os AVCs, associados à covid-19. Não apenas em idosos, mas também em pacientes jovens e, muitas vezes, como primeira manifestação da doença. Isso se deve aos distúrbios da coagulação causados pelo vírus, que lesam as paredes das artérias, desencadeando o processo de trombose”, conta o médico que faz parte da comissão de especialistas e economistas – como Armínio Fraga – criada pelo governador Witzel, para avaliar a adesão ao isolamento testes e vacinas e plano de saída controlada da quarentena.
Melhores momentos da conversa.
Como foi essa transformação do Instituto Estadual do Cérebro em hospital de covid-19?
Ele continua sendo do cérebro, mas atendendo pedido da secretaria de Saúde, do estado do Rio, suspendemos cirurgias e colocamos 44 leitos de UTI e equipe de intensivistas e fisioterapeutas à disposição de pacientes com covid-19.
O hospital continua funcionando para outras doenças?
Com exceção do centro cirúrgico, todos os demais setores tratam epilepsia, doenças endovascular. Ambulatórios também continuam atendendo normalmente.
Vocês foram os primeiros a iniciar o tratamento de transfusão de plasma com anticorpos de quem sarou da covid-19.
Qual resultado?
Só atendemos casos graves e como iniciamos os testes há duas semanas, ainda é cedo para avaliar. Entretanto, a transfusão de anticorpos parece ser, até agora, o que faz mais sentido. Idealmente, deve ser tentado logo no inicio da doença, para evitar sua progressão. Temos que nos guiar pelos exames de sangue, acompanhando os marcadores inflamatórios, a carga viral e outros parâmetros. Estamos esperançosos.
O custo é alto?
A transfusão de plasma não é novidade, é um procedimento corrente nas UTIs, não para transmissão de anticorpos, mas para transmissão de elementos da coagulação, por exemplo. A transfusão de anticorpos também não é nova, já foi usada na pandemia da Gripe Espanhola, em 1918, e em outras epidemias mais recentes. Apesar de publicações da época relatarem redução da mortalidade, esse tratamento, por ser feito sempre em crises, nunca foi avaliado com rigor científico e, por isso, ainda é considerado experimental, necessitando de aprovação da Anvisa.
Outros hospitais estão fazendo o mesmo no Brasil?
Se não começaram, devem estar se preparando para isso. Os grandes hospitais dos EUA também estão fazendo e todos procurando identificar os grupos de pacientes que podem se beneficiar. Qual o bom doente, o bom momento e a boa dose. Serão os mais idosos ou aqueles que têm uma carga viral mais elevada? Os trabalhos antigos sugerem melhor resultado se os anticorpos forem transfundidos precocemente, ao início da doença, tentando evitar o comprometimento pulmonar, a entubação, e os distúrbios da coagulação.
O que a covid-19 tem de diferente de outros vírus?
Primeiro, a rapidez com que se propaga. Depois, ele não tem um padrão, podendo se manifestar de várias formas, como se fossem várias doenças diferentes. Muitos são assintomáticos. Outros perdem o olfato e, consequentemente, o paladar, acompanhado de uma gripe leve, que evolui bem. Por fim, há aqueles que preocupam, em geral obesos ou portadores de outras doenças crônicas, que podem apresentar comprometimento pulmonar e necessitar de UTI e entubação. É como se fossem variações do mesmo vírus ou características genéticas de cada indivíduo, que vão determinar a evolução da doença.
Isso o surpreende?
Não. Vimos isso na epidemia da AIDS, algumas pessoas simplesmente não pegavam. Em alguns casais, apenas um dos cônjuges se infectava. O mesmo se passa agora com a covid-19. Então há aspectos individuais, talvez genéticos, que fazem a diferença, e há muito ainda a ser entendido.
O que de fato o coronavírus faz com o pulmão? As pessoas se recuperam?
Além da inflamação, esses pacientes apresentam distúrbios variáveis da coagulação, que produzem vários microinfartos no pulmão. Aqueles que se recuperam, portanto, podem perder um pouco da sua capacidade pulmonar.
Existe também algum efeito desse vírus no cérebro?
Pesquisas recentes de laboratório mostram que o vírus pode penetrar nos neurônios, mas isso, entretanto, ainda não é visto nos pacientes. O que vemos cada vez mais são os acidentes vasculares cerebrais, conhecidos AVCs, associados à covid-19.
Isso ocorre apenas no cérebro?
Não, em todo o corpo. O que pode resultar também em isquemia de qualquer outro órgão ou mesmo das extremidades, braços e pernas. O distúrbio de coagulação ocorre em praticamente todos os casos. Parece fazer parte da doença, é considerado como uma das principais causas da lesão pulmonar e da falência respiratória. Todos os doentes, hoje, internados, com covid-19, estão tomando anticoagulantes, em doses maiores ou menores, dependendo dos exames.
Como é que a pessoa chega no Instituto Estadual do Cérebro?
Recebemos apenas pacientes do SUS, mas não é um hospital aberto. As vagas são reguladas pela Secretaria Estadual de Saúde, que encaminha os pacientes que se encontram nas UPAS, ou em outros hospitais, e que preencham os requisitos. São, em geral, pacientes em estado grave, com insuficiência respiratória, já entubados ou precisando entubar.
E desses casos graves, quantos se recuperam?
Nosso primeiro doente foi internado há 40 dias, aproximadamente, e só agora ele está curando. Até agora, nossa mortalidade tem sido em torno de 25% dos doentes entubados, quase todos acima de 60 anos. Entre os não entubados, a mortalidade foi zero. Observamos também que a obesidade é o fator de risco mais importante para os pacientes jovens.
A contaminação no Instituto está alta?
A contaminação entre funcionários de saúde é elevada, e em nosso hospital chega a 50%. Isso inclui médicos, enfermeiros, pessoal da limpeza, enfim, todos. Diariamente testamos aqueles que apresentam algum sintoma, e a metade testa positivo. Estes são afastados temporariamente e substituídos.
Agora um tema polêmico, o que acha da cloroquina?
Não se mostrou eficaz, em nossos casos. Suspendemos seu uso por causa das graves arritmias cardíacas que esses pacientes apresentavam, sem nenhuma evidência de melhora.
Quanto ao teste da covid-19 pelo nariz é, de fato, seguro?
Quando ele é positivo ele é seguro, sim, mas quando é negativo tem uma margem de erro de quase 40%. Ou seja, você pode testar negativo e estar contaminado.
Pelo que tem visto, há possibilidade de mutação desse vírus?
Certamente. Pode, inclusive, já haver alguma mutação, e isso explicaria porque alguns casos são mais simples e outros são tão graves. É possível que no próximo ano ele volte mudado, mas com menos força. Teríamos, então, que fazer vacinações anuais, como já se faz para as gripes por Influenza.
Tem que sair uma vacina para a cura, então…
Essa parece ser a única solução. Outra possibilidade de controle seria quando alcançássemos a chamada imunidade de rebanho, que é quando 70% da população já teve contato com o vírus e adquiriu anticorpos.
Sobre o SUS, muita gente está elogiando ante a pandemia. Qual sua opinião?
O SUS foi a coisa mais importante que já se fez no país. Nunca houve um movimento de inclusão social tão grande, no mundo, como o que resultou da criação do SUS. Milhões de brasileiros que se encontravam à margem do serviço social, sem direito a nada, foram incorporados. Acho que está claro a todos que o SUS está sendo fundamental nessa crise e que sairá fortalecido, valorizado.
E o que falta para o SUS? Recursos?
Acho que para melhorar precisaria de mais recursos e de gestão moderna e pragmática.
Sobre a quarentena, já estamos há dois meses em isolamento social, o senhor é a favor?
Sim. O isolamento é um recurso bíblico. Já era utilizado na antiguidade, quando não havia tratamento para hanseníase. Acho que não há outra maneira de conter uma doença infecciosa, para a qual não há tratamento. Agora, como todo remédio, tem seus efeitos colaterais, é preciso saber o momento de reduzir a dose.
Como imagina o mundo pós-coronavírus?
De imediato, teremos 230 milhões de infectologistas no País. Talvez o mundo fique mais humanizado, com as pessoas valorizando a presença e o contato físico. Ainda assim, a crise alavancou a vida virtual, seja social e profissional, de maneira irreversível.
Reportagem de Sonia Racy n'O Estado de São Paulo de 11 de maio de 2020
https://cultura.estadao.com.br/blogs/direto-da-fonte/vemos-cada-vez-mais-avcs-ligados-a-covid-19-diz-paulo-niemeyer-filho/
Assinar:
Postagens (Atom)
$textfile ="http://geocities.yahoo.com.br/danigiscard/random1.txt";
$quotes = file("$textfile");
$quote = rand(0, sizeof($quotes)-1);
echo $quotes[$quote]; ?>?
$textfile>