quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Sucessão paulistana e o samba do crioulo doido

Geleia geral

Serra dá sinais de que pode tornar-se candidato e embaralha mais o já confuso vale-tudo da sucessão na prefeitura paulistana

Décadas atrás, circulava a expressão "geleia geral brasileira", usada para designar a falta de conteúdo ideológico da política nacional. Desde então, essa característica se acentuou a ponto de dominar quase por completo nossa desoladora paisagem partidária.

O melhor exemplo está na disputa pela prefeitura da cidade mais desenvolvida do país, São Paulo. O ex-ministro Fernando Haddad, candidato do PT -partido de esquerda, ainda que moderada-, parece prestes a selar aliança com o prefeito Gilberto Kassab, conservador egresso do DEM, partido situado à direita no espectro ideológico.
No centrista PSDB a confusão não é menor. Como o ex-governador José Serra, visto como o melhor candidato na agremiação tucana, não se dispunha a concorrer, organizaram-se prévias, previstas para 4 de março, a fim de escolher um entre quatro postulantes de menor expressão eleitoral.
A disputa interna seria um caminho legítimo para revitalizar o PSDB paulista, que sofre o desgaste decorrente do longo predomínio na política local. Mas eis que, na undécima hora, José Serra emite sinais de que quer ser o candidato.
Para complicar o que já era confuso, o prefeito Kassab, líder do recém-criado PSD, declara-se apoiador de Serra caso este venha a ser o candidato do PSDB. Já o governador tucano Geraldo Alckmin prefere Serra, até para afastar um possível concorrente na sua planejada reeleição, em 2014.
Consta, porém, que o governador nutre simpatias por outro pretendente, o deputado Gabriel Chalita, ex-peessedebista hoje abrigado no PMDB, a quem poderia apoiar caso o candidato tucano, seja quem for, não chegue ao segundo turno nas eleições deste ano.
Não seria de esperar, talvez nem de desejar, que os partidos brasileiros tivessem a nitidez ideológica que é comum nos partidos europeus ou mesmo nas duas maiores agremiações norte-americanas. Nossa cultura política é outra.
Mas não é demais exigir que se respeite um mínimo de identidade programática. No âmbito nacional, tucanos e petistas -variações de centro e de centro-esquerda da vertente social-democrata- vinham mantendo certa coerência em suas trajetórias, por mais que convergissem nos últimos dez anos.
Agora, sob o pretexto de que esta é uma era "pós-ideológica", parece instalar-se o vale-tudo em escala inédita. Partidos, discursos, programas -tudo se torna mero instrumento a serviço do carreirismo de cada político, numa desfaçatez que dispensa até mesmo a hipocrisia das aparências.
De degradação em degradação, o risco é que todos os partidos -e não apenas a maioria dos 29 em atuação no país- acabem convertidos em legendas de aluguel.

Editorial da Folha de São Paulo de 15/02/2012

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Oposição emparedada
Se consolidada, a aliança entre o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e o PT na disputa pelo comando da capital paulista será mais um prego no caixão da agonizante oposição.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está aos poucos interditando todo o espectro político para quem não apoia o projeto do PT em nível nacional. Sem ter com quem se aliar, PSDB, DEM e PPS ficam cada vez mais sem perspectiva de poder e com um futuro desolador.
Há várias formas de fazer política. Montar coalizões é uma necessidade inescapável. Num país com 29 partidos, quem não se alia fica com chance reduzida de vitória em disputas locais ou nacionais.
Lula já desfrutava da mais ampla aliança partidária quando ocupou o Palácio do Planalto nos seus últimos anos de poder. Agora, a presidente Dilma Rousseff ampliou o escopo de influência do PT.
Na Câmara, há hoje 23 partidos representados. A rigor, só quatro são, de fato, oposição orgânica ao Planalto: PSDB, DEM, PPS e PSOL.
Egresso de siglas conservadoras e admirador do tucano José Serra, o prefeito de São Paulo seria o aliado natural do PSDB na eleição paulistana de outubro. Só que Kassab ficou emparedado pela incapacidade de seus parceiros mais óbvios se decidirem sobre qual rumo seguir.
Ainda falta muito tempo até a eleição, neste ano em 7 de outubro. Reviravoltas podem ocorrer. Mas, a ser mantida a tendência atual, com o PT conquistando a Prefeitura de São Paulo bancado por uma aliança de amplo espectro, a oposição enfrentará uma agudização de sua crise atual -por ser incapaz de sair do seu estado de catatonia.
As eleições municipais não determinarão o que acontecerá em 2014, nas escolhas de governadores e do presidente da República. Mas são um termômetro do que virá por aí. Sobretudo para a oposição, cada vez mais depauperada e sem norte.

De Fernando Rodrigues na Folha de São Paulo de 15/02/2012

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http://www.youtube.com/watch?v=P-5LLSWkf-A

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