Um país de estupradores?
A África do Sul reage à epidemia de violência sexual
RESUMO Colonialismo e apartheid fizeram da África do Sul recordista em crimes sexuais, com 75,6 estupros por grupo de 100 mil habitantes. Após um período de negacionismo oficial e estigmatização, governo e sociedade reagem à epidemia, causada por uma conjunção de fatores sociais, políticos e culturais.
FÁBIO ZANINI
LAURA CAPRIGLIONE
"ELE SE LEMBRA, quando criança, de ler a palavra 'rape', estupro, em reportagens de jornal, tentando entender exatamente o que queria dizer, imaginando o que a letra p, sempre tão suave, estava fazendo no meio de uma palavra considerada tão horrenda que ninguém a falava em voz alta."
Assim como a letra p não parece se encaixar naquela palavra tão horrenda, o erudito David Lurie, professor de literatura que cai em desgraça, parece não se encaixar em seu país, dominado pela barbárie. Ele quer entender o que acontecera dias antes com sua filha Lucy, atacada por três homens no sítio em que vivia no interior da África do Sul.
Lurie é o personagem principal de "Desonra" (trad. José Rubens Siqueira, Companhia das Letras, 2000), o romance que deu ao sul-africano J.M. Coetzee (pronuncia-se "coutsía") seu segundo Booker Prize, o mais prestigioso das letras britânicas. O estupro da filha de Lurie simboliza ficcionalmente a onda de violência sexual que domina a África do Sul.
"Ele pensa em Byron", narra Coetzee, evocando o poeta romântico inglês da predileção de seu refinado personagem. "Entre as legiões de condessas e criadas em que Byron se enfiou havia sem dúvida aquelas que chamavam o ato de estupro. Mas sem dúvida nenhuma delas tinha por que temer terminar a sessão com a garganta cortada."
FORA DA FICÇÃO Mais de dez anos depois da publicação do romance de Coetzee, o temor de ser estuprada e terminar com a garganta cortada não é exatamente uma situação ficcional. A poucos dias do início da Copa do Mundo, a ministra sul-africana das Mulheres, Juventude e Pessoas com Deficiências, Noluthando Mayende-Sibiya, fez um discurso inflamado na Cidade do Cabo. O objetivo era um só: advertir que o governo não toleraria episódios de violência sexual durante o campeonato.
Militante histórica do partido de Nelson Mandela, o Congresso Nacional Africano (CNA), Mayende-Sibiya, anunciou uma série de medidas contra a violência sexual: iluminação e limpeza dos locais potencialmente perigosos, campanhas de vigilância comunitária, policiamento preventivo, e criação de centros para acolher e cuidar de vítimas.
Também foi anunciada a construção de um parque no local em que foi encontrado, em janeiro, o cadáver decomposto de Masego Kgomo, no distrito de Soshanguve, a 45 km de Pretória, a capital administrativa da África do Sul. A ministra prometeu uma estátua em homenagem a Masego.
Aos 10 anos, ela foi sequestrada, torturada, estuprada e assassinada por um grupo de jovens negros. Segundo a polícia, uma sangoma, curandeira tradicional, teria estimulado o ataque.
CAMPEÃO MUNDIAL Um relatório publicado pela ONU em 2002, com dados de 50 países, confere à África do Sul o vergonhoso título de campeão mundial de estupros. Logo depois vêm Canadá, EUA, Nova Zelândia e Suécia. É preciso cautela ao analisar esse tipo de dado: eles podem significar, por exemplo, que as mulheres desses países se sentem mais à vontade para dar parte na polícia. Os números sul-africanos, no entanto, são eloquentes.
Uma pesquisa patrocinada pelo próprio governo sul-africano mostrou que, em 2007, houve 75,6 estupros por grupo de 100 mil habitantes -cinco vezes o registrado na cidade de São Paulo. Nos 12 meses contados a partir de abril de 2008, foram mais de 70 mil queixas de crimes sexuais, aumento de 10,5% em relação ao período anterior.
Calcula-se que sejam muito mais, pois é comum que as vítimas de estupro se recusem a prestar queixa. Segundo a organização não-governamental Pessoas contra o Abuso de Mulheres, apenas um em cada nove estupros na África do Sul é denunciado à polícia. Entre eles, apenas 7% terminam em condenação.
Índices mais chocantes dão conta de um estupro a cada 30 segundos no país, ou 1,2 milhão de estupros por ano. Uma pesquisa divulgada no ano passado pelo Conselho de Pesquisa Médica da África do Sul, com base em entrevistas com 1.738 homens, aponta que um em cada quatro homens das Províncias de KwaZulu-Natal e do Cabo Oriental estaria envolvido em agressões sexuais, entendidas como sexo não consentido ou tentativa.
LENIÊNCIA OFICIAL Rachel Jewkes e Naeema Abrahams, pesquisadoras do Grupo de Gênero e Saúde do Conselho de Pesquisa Médica, em Pretória, tentam explicar por que, afinal, esse tipo de violência tornou-se uma epidemia na África do Sul.
Segundo elas, existe um caldo cultural permissivo -a polícia pouco prende, a Justiça pouco age e a sociedade ainda desconfia que a vítima deu margem para ter sido estuprada. As pesquisadoras também relatam rastros de corrupção na polícia: "Quando, apesar de tudo, as denúncias são feitas, não é raro a polícia, em troca de uns trocados, 'perder' documentos e laudos que comprovam o crime".
Em Gauteng, Província onde ficam Johannesburgo e Pretória, somente 17,1% das queixas de estupro resultam em julgamento -e apenas 6% em condenação. A leniência oficial termina por desencorajar novas denúncias, num círculo vicioso de impunidade.
É comum a própria polícia abandonar o caso, em geral, por deficiência na investigação. Em 78,4% das queixas, segundo o estudo "Tracking Justice" (Acompanhando a Justiça), feito a partir de boletins de ocorrência, o policial nem sequer pediu à vítima que descrevesse o agressor. Em 52,3% dos casos, o agressor jamais foi localizado.
Em entrevista à Folha, Bashir Hoosain, diretor-geral de Segurança e Proteção da Província do Cabo Oriental, admite que há problemas na coleta de provas e no trato com as vítimas. "Temos procurado aproximar a polícia da comunidade, trazendo pessoas para dentro das delegacias para debater conosco os problemas", diz ele. "O número de mulheres policiais também cresceu."
REAÇÃO ARMADA A alegada tolerância em relação ao crime, numa sociedade já violenta após décadas de regime colonial e apartheid, teria gerado uma cultura do estupro.
Qualquer turista em Johannesburgo se impressiona com as ameaçadoras placas fixadas na fachada das casas: invariavelmente, fala-se em "reação armada". O assalto a residências está entre os principais medos na cidade, e em 90% dos casos os bandidos aproveitam para estuprar as moradoras, segundo a polícia local.
A impressão de impunidade, dizem as pesquisadoras, também facilita o surgimento das gangues de jovens que estupram e matam, que ficaram tristemente famosas na Cidade do Cabo no final do século 20. Mais do que na vítima, o foco dos agressores está nos cúmplices. A observação do ato funciona como rito de iniciação à vida adulta.
Um diálogo entre David Lurie, o personagem de J.M. Coetzee, e sua filha, estuprada por dois homens e um jovem, sintetiza o funcionamento das gangues: "Um excitava o outro. Deve ser por isso que fazem juntos. Como cachorros em bando". O pai então pergunta: "E o terceiro, o rapaz?". Lucy responde: "Estava lá para aprender".
Assim como aconteceu com Lucy em "Desonra", grande parte dos estupros ocorre dentro de casa. Há dois anos, o estudo "Tracking Justice" mostrou que em 25% dos casos o responsável é parente, namorado ou ex-namorado da vítima. Casos como o de Letta Majas, 39, moradora da favela de Alexandra, em Johannesburgo, são comuns.
"Toda sexta, meu namorado ia direto do trabalho para o bar", conta ela. "Chegava em casa às 23h, querendo sexo. Um dia, eu recusei, porque não queria dividir a cama com um bêbado de cerveja. Ele respondeu que era porque eu estava saindo com outro homem. Me jogou contra uma parede, me chutou e me estuprou."
Em Johannesburgo, há dezenas de "casas seguras" para mulheres como Letta, que não podem voltar para casa -ou serão estupradas. Em Alexandra, a Bombani Safe House funciona atrás de muros altos e arame farpado. A preocupação é com a privacidade de suas "clientes". Mais do que um eufemismo, a nomenclatura é uma tentativa de reduzir o estigma da vítima.
CURANDEIRISMO Quando a epidemia de Aids explodiu na África do Sul, chegou-se a sugerir uma explicação "mágica": o surto de estupros de adolescentes seria ligado à crença de que o sexo com "virgens puras" poderia "limpar" o sangue de quem com elas se relacionasse. Rachel Jewkes e Naeema Abrahams têm uma explicação mais pragmática: "O mais provável é que os estupradores acreditem que, atacando uma virgem, tenham menos chances de contrair o vírus HIV".
Uma juíza que já atuou em vários casos baixou a voz para dizer à Folha em um restaurante de Johannesburgo: "Ninguém quer falar sobre isso, mas é terrível o envolvimento de curandeiros e curandeiras nesse tipo de crime. Ou praticam diretamente, ou pedem que outros o façam, a fim de aumentar seus supostos poderes". Segundo ela, o assunto virou tabu porque essas práticas religiosas pertencem à reclusa esfera da vida levada segundo os ditames tradicionais.
Até 2004, o então presidente sul-africano, Thabo Mbeki, da etnia xhosa, acusava de "racista" a estridência mundial a respeito da violência sexual no país. Em artigo publicado no site do Congresso Nacional Africano, ele escreveu: "Dizem que nossa herança africana na cultura, tradições e religiões faz de cada homem africano um potencial estuprador. É um ponto de vista que define todo o povo africano como selvagens bárbaros".
Mbeki investia contra a jornalista branca Charlene Smith -ex-militante antiapartheid, ela mesma estuprada em 1999 durante assalto a sua casa-, que escreveu no jornal "Sunday Independent" o artigo "O estupro tornou-se uma forma repugnante de vida em nossa terra".
Mbeki respondeu que, por trás das denúncias da epidemia de estupros na África do Sul, não existiria nada além da velha repetição dos estigmas que os colonizadores brancos e europeus sempre quiseram colar na pele negra. Segundo ele, o povo negro seria visto como um bando de "preguiçosos, mentirosos, de odor fétido, doentes, corruptos, violentos, amorais, sexualmente depravados, animalescos, selvagens -e estupradores".
A perigosa relação entre identidade nacional e barbárie já surgiu em outros contextos históricos e culturais. Depois do Holocausto, ainda há quem queira associar, por exemplo, os alemães a nazistas em potencial. Não há dúvida, porém, de que reuniram-se na Alemanha do Terceiro Reich condições específicas (algumas essencialmente culturais) que levaram o povo alemão à barbárie nazista. O que não significa afirmar que a barbárie esteja na identidade nacional alemã.
A ideia de "cada homem africano como um estuprador potencial" reaparece, com sinal invertido, no relatório "Qualquer um pode ser um estuprador", do Centro de Estudos da Violência e Reconciliação. O texto procura entender os fatores individuais, de relacionamento, comunitários e sociais que levam o país a se tornar campeão dos crimes sexuais.
Quando todos os fatores se conjugam, aí sim, "qualquer um pode se tornar um estuprador". Em qualquer país.
NEGACIONISMO O então presidente Mbeki não negou apenas o problema do estupro. Sua mais famosa negação foi em relação à proliferação da Aids no país, que não passaria de invenção da indústria farmacêutica.
Citando uma tese do pesquisador americano Peter Duesberg, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e da Academia Nacional de Ciências dos EUA, ele sustentava que o vírus HIV não seria o causador da AIDS. A deficiência imunológica característica da doença seria uma decorrência da fome e dos problemas crônicos da saúde sul-africana -herança maldita do apartheid.
Em novembro de 2008, sem políticas de prevenção ou tratamento, a África do Sul bateu nos 365 mil mortos por Aids, 60% dos quais mulheres. Hoje, o vírus está no sangue de mais de 5 milhões de sul-africanos (a população é de 48 milhões).
O hospital Baragwanath, no bairro de Soweto, em Johannesburgo, é um gigante com mais de 4 mil leitos, considerado o maior da África. Lá, ainda não se atendem casos de estupro que não sejam acompanhados por lesões físicas graves: "O estupro é um problema menor para ser tratado aqui", disse o relações-públicas à reportagem da Folha, na semana passada. Muitos profissionais de saúde no país não veem a violência sexual como uma questão de saúde pública, embora ela acompanhe os índices de infecção por HIV.
Nas macas encostadas nas paredes de tijolinhos do pronto-socorro viam-se apenas pacientes negros -vários deles esqueléticos, com as feridas características dos doentes de Aids sem tratamento.
SURPRESA E, no entanto, quando este texto é escrito, já se passaram 12 dias do início da Copa do Mundo. Todas as nove cidades-sede receberam 220 mil torcedores e turistas, fluxo várias vezes maior do que o habitual. E não se ouviu falar em onda de estupros.
A enfermeira Smangele Zulu, funcionária da clínica Zolach, em Soweto, especializada em primeiros socorros, arrisca uma hipótese: "Realmente está mudando o tratamento dispensado ao agressor e à vítima nos casos de estupro -mais rigor para o predador, mais acolhimento para a vítima". "Smangele" significa "surpresa" na língua tribal.
As políticas negacionistas em relação à Aids e ao estupro sofreram o seu maior revés numa trapalhada do zulu Jacob Zuma, presidente do país e polígamo (com três mulheres, 20 filhos e algumas namoradas). Em 2005, quando era o vice-presidente de Mbeki, Zuma foi acusado de estuprar uma mulher de 31 anos, soropositiva e amiga de longa data de sua família. Levado aos tribunais, Zuma disse que, sim, tivera relações sexuais com a mulher, mas por iniciativa dela. Acabou absolvido em 2006.
No tribunal, o promotor quis saber se Zuma havia usado preservativo. "Não." Perguntou-se então se o acusado não tivera medo de contrair o vírus da Aids. "Não, não havia risco, porque tomei uma ducha logo depois."
As organizações de prevenção à Aids e as feministas não demoraram a acusar Zuma de "irresponsável". Mas, depois do caso, viu-se que a necessidade do uso de preservativos jamais tinha sido tão discutida na África do Sul como naquela época.
Na disputa pelo controle do Congresso Nacional Africano, um fragilizado Zuma, às voltas com denúncias de corrupção, concordou em fazer uma composição política original: entregou 43% dos ministérios a mulheres, para conseguir o apoio de mais da metade do eleitorado sul-africano. O resultado imediato da manobra foram mulheres em situação de muito mais poder do que jamais na história sul-africana. E o fim do negacionismo.
REAÇÃO O enterro da menina Masego Kgomo, em 16 de janeiro, contou com a presença da ministra da Mulher, Noluthando Mayende-Sibiya, da vice-ministra do Desenvolvimento Econômico, Gwen Mahlangu Nkabinde, do secretário da Província de Gauteng para a Segurança da Comunidade, Khabisi Mosunkutu, e da prefeita da cidade de Tshwane, Gwen Ramokgopa.
No cemitério Zandfontein, logo depois do popular Solly Moholo cantar uma canção gospel, seguida de hinos religiosos entoados pelo coral da escola onde Masego estudava, o secretário Mosunkutu repreendeu a comunidade. "Por que as pessoas que viram a menina gritar não fizeram nada?", perguntou ele. "Como é possível que o dono do bar aonde os agressores levaram uma menina de 10 anos não tenha percebido nada de errado?"
A mudança veio quando Mosunkutu condenou os assassinatos relacionados ao curandeirismo: "Tem gente se escondendo atrás da nossa cultura para perpetrar atos criminosos. Precisamos deixar claro que a nossa cultura não tem nada a ver com pedaços de corpos humanos para rituais 'muti'", disse ele, referindo-se a "trabalhos" religiosos. "Isso não passa de criminalidade."
Corando, a prefeita de Tshwane, Gwen Ramokgopa, disse que é necessária a colaboração dos curandeiros tradicionais "corretos", para que sejam extirpados aqueles que cometem crimes em nome dos rituais "muti".
Não faltam tentativas canhestras de resolver o problema, como a campanha oficial "Masturbe-se, Não Estupre!", lançada em 2007, ou a "camisinha antiestupro", curioso invento da médica Sonnet Ehlers. O apetrecho é dotado de pequenas lâminas que supostamente ferem o agressor e inviabilizam a conclusão do ato - embora sua eficácia ainda esteja longe de ter sido comprovada.
O que está claro é que há uma reação institucional. Em junho de 2009, Mayende-Sibiya fez questão de levar sua solidariedade à família de Nadine Jantjies, menina de 7 anos que foi violentada e morta pelo tio, Manfred Swartz, que confessou o crime.
Na ocasião, a ministra Mayende-Sibiya disse: "Trago a mensagem de que este governo não tolerará mais crimes de violência sexual. E que trabalharemos para que a Justiça se faça da forma mais rápida possível."
"Um relatório publicado pela ONU em 2002, com dados de 50 países, confere à África do Sul o vergonhoso título de campeão mundial de estupros. Logo depois vêm Canadá, EUA, Nova Zelândia e Suécia"
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Da Folha de São Paulo de 272/06/10
domingo, 27 de junho de 2010
terça-feira, 22 de junho de 2010
A venda de terras a estrangeiros
A decisão de proibir a aquisição de terras brasileiras por estrangeiros tem como pano de fundo o aumento da demanda mundial por recursos naturais, como a escassez de água e crise de alimentos, a elevação dos preços das terras e os impactos sobre populações pobres no acesso à terra. "Vamos fazer uma PEC [Proposta de Emenda Constitucional] para deixar claro aos investidores que podem investir em qualquer campo, mas não em terras", informou o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, ao Valor.
A PEC teria poder para anular títulos já registrados por estrangeiros a partir de uma data de corte a ser estabelecida pelo grupo de ministros que estuda o tema. "Terra não é um assunto qualquer. Tem que cumprir a função social. Como cobrar isso de um fundo estrangeiro que comprou metade do Norte do país?", questionou Cassel. "Isso não fere o capitalismo. É um assunto maduro, não podemos ter medo de enfrentar. Isso une pequenos, médios e grandes, da Kátia Abreu [presidente da CNA] ao João Pedro Stédile [dirigente do MST]", disse.
Fundos internacionais de "private equity" e de hedge, cuja carteira global supera US$ 10 bilhões, têm sido cada vez mais agressivos em seus investimentos em terras no Brasil. Um quarto dos 120 principais investidores corporativos já tem um pé em território brasileiro, mostra levantamento da ONG espanhola de pesquisas e análises Grain.
Para fechar o cerco ao "avanço indiscriminado" desses fundos, o governo já tem um esboço de um "código de conduta" a ser seguido por estrangeiros. As regras incluem transparência nas negociações ("consentimento informado"), respeito pelo direito a terras existentes, partilha dos benefícios com comunidades locais, sustentabilidade ambiental e adesão a políticas nacionais de comércio e segurança alimentar.
"Esse é um problema que nós precisamos começar a discutir. Porque uma coisa é o cidadão vir, comprar uma usina, comprar fábrica. Outra coisa é ele comprar a terra da fábrica, é ele comprar a terra da soja, é ele comprar a terra do minério", alertou o presidente Lula, há duas semanas, durante anúncio do Plano de Safra 2010/11.
O governo identificou uma forte concentração do interesse do capital externo no Centro-Oeste do país. Dados de um estudo inédito mostram que 53% das áreas compradas por estrangeiros estão nessa região. Desse total, cerca de 3,4 milhões de hectares (83,4%) estão vinculadas a 5,6 mil propriedades médias e grandes. Os 100 maiores imóveis em mãos estrangeiras correspondem a 763,2 mil hectares. O maior deles tem 31,3 mil hectares. A maior parte foi adquirida após 1980 - 84% foram registradas em médias e grandes propriedades. Japoneses, seguidos de italianos, libaneses, uruguaios e argentinos, são os maiores investidores em terras, diz o estudo.
Mauro Zanatta, Do Valor Econômico
A PEC teria poder para anular títulos já registrados por estrangeiros a partir de uma data de corte a ser estabelecida pelo grupo de ministros que estuda o tema. "Terra não é um assunto qualquer. Tem que cumprir a função social. Como cobrar isso de um fundo estrangeiro que comprou metade do Norte do país?", questionou Cassel. "Isso não fere o capitalismo. É um assunto maduro, não podemos ter medo de enfrentar. Isso une pequenos, médios e grandes, da Kátia Abreu [presidente da CNA] ao João Pedro Stédile [dirigente do MST]", disse.
Fundos internacionais de "private equity" e de hedge, cuja carteira global supera US$ 10 bilhões, têm sido cada vez mais agressivos em seus investimentos em terras no Brasil. Um quarto dos 120 principais investidores corporativos já tem um pé em território brasileiro, mostra levantamento da ONG espanhola de pesquisas e análises Grain.
Para fechar o cerco ao "avanço indiscriminado" desses fundos, o governo já tem um esboço de um "código de conduta" a ser seguido por estrangeiros. As regras incluem transparência nas negociações ("consentimento informado"), respeito pelo direito a terras existentes, partilha dos benefícios com comunidades locais, sustentabilidade ambiental e adesão a políticas nacionais de comércio e segurança alimentar.
"Esse é um problema que nós precisamos começar a discutir. Porque uma coisa é o cidadão vir, comprar uma usina, comprar fábrica. Outra coisa é ele comprar a terra da fábrica, é ele comprar a terra da soja, é ele comprar a terra do minério", alertou o presidente Lula, há duas semanas, durante anúncio do Plano de Safra 2010/11.
O governo identificou uma forte concentração do interesse do capital externo no Centro-Oeste do país. Dados de um estudo inédito mostram que 53% das áreas compradas por estrangeiros estão nessa região. Desse total, cerca de 3,4 milhões de hectares (83,4%) estão vinculadas a 5,6 mil propriedades médias e grandes. Os 100 maiores imóveis em mãos estrangeiras correspondem a 763,2 mil hectares. O maior deles tem 31,3 mil hectares. A maior parte foi adquirida após 1980 - 84% foram registradas em médias e grandes propriedades. Japoneses, seguidos de italianos, libaneses, uruguaios e argentinos, são os maiores investidores em terras, diz o estudo.
Mauro Zanatta, Do Valor Econômico
domingo, 20 de junho de 2010
Mensagem falsa sobre estrangeiros na Amazônia complica vida de acadêmica
Mensagem falsa sobre estrangeiros na Amazônia complica vida de acadêmica
Internauta que encaminhou e-mail já foi procurada até pela Polícia Federal.Texto circula há mais de 5 anos e cita suposto domínio estrangeiro em RR.
Uma corrente de e-mail com informações equivocadas sobre a Amazônia circula há anos pela internet, confundindo internautas que repassam a mensagem e gerando problemas para dois acadêmicos de São Paulo, que aparecem como autores do texto em sua versão mais disseminada. A mensagem diz ser baseada no "relato de uma pessoa conhecida e séria", que esteve "recentemente" em Roraima.
Em linhas gerais, o relato da mensagem dá a entender que áreas de Roraima são controladas por estrangeiros, citando, entre outras coisas, reservas que teriam bandeiras americanas e inglesas hasteadas. O narrador chega à conclusão de que "os americanos vão acabar tomando a Amazônia". "Saio daqui com a quase certeza de que o Brasil irá diminuir de tamanho", diz outro trecho.
Reserva dos Waimiri-Atroari, em Roraima, citada na falsa mensagem.
A terra indígena foi homologada em 2005 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e gerou grande polêmica entre indígenas e arrozeiros do estado nos anos anteriores.
Parte da polêmica do e-mail é baseada em outra reserva indígena, a dos Waimiri-Atroari, na divisa entre os estados de Amazonas e Roraima. Segundo o texto, existe um trecho da rodovia BR-174, construída entre Manaus e Boa Vista, que passa por dentro da reserva e tem seu acesso bloqueado a brasileiros. "O acesso é livre aos americanos, europeus e japoneses", diz o e-mail.
Em linhas gerais, o relato da mensagem dá a entender que áreas de Roraima são controladas por estrangeiros, citando, entre outras coisas, reservas que teriam bandeiras americanas e inglesas hasteadas. O narrador chega à conclusão de que "os americanos vão acabar tomando a Amazônia". "Saio daqui com a quase certeza de que o Brasil irá diminuir de tamanho", diz outro trecho.
(Foto: Eletronorte/Divulgação)
Não existe referência exata sobre a data em que a corrente se espalhou na internet pela primeira vez, mas pessoas ouvidas pelo Globo Amazônia disseram ter visto o e-mail já em 2003 e 2004. O coordenador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em Roraima, Vicente de Paulo, acredita que a corrente já é famosa há pelo menos dez anos. "Isso começou no início dos debates mais efetivos sobre a Raposa Serra do Sol", diz ele.
A terra indígena foi homologada em 2005 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e gerou grande polêmica entre indígenas e arrozeiros do estado nos anos anteriores.
Parte da polêmica do e-mail é baseada em outra reserva indígena, a dos Waimiri-Atroari, na divisa entre os estados de Amazonas e Roraima. Segundo o texto, existe um trecho da rodovia BR-174, construída entre Manaus e Boa Vista, que passa por dentro da reserva e tem seu acesso bloqueado a brasileiros. "O acesso é livre aos americanos, europeus e japoneses", diz o e-mail.
Operários finalizavam a construção do trecho da BR-174 que passa pela reserva Waimiri-Atroari em 2008. Hoje, a interrupção do tráfego de veículos à noite impede a morte de animais e ainda há um trecho de 50 quilômetros em condições precárias. (Foto: Antonio Diniz/ Secom Roraima/ Divulgação)
A BR-174 corta um pedaço de terra de 125 quilômetros dentro da reserva Waimiri-Atroari e os indígenas restringem a circulação de alguns veículos durante a noite desde a inauguração da via. O caso é polêmico e o governo de Roraima tenta acabar com a existência do bloqueio na Justiça.
Mas não é verdade que brasileiros são impedidos de passar por ali, segundo Marcelo Cavalcante, um dos diretores da Associação Comunidade Waimiri Atroari. "Chamamos o bloqueio de interrupção seletiva. Todos os dias, das 18h30 às 5h30, os indígenas fecham a estrada para proteger os animais que têm hábito noturno e servem de alimento para a comunidade", diz ele.
Os indígenas permitem a passagem de ônibus, caminhões com material perecível, ambulância e autoridades que estejam a serviço, mas mesmo assim continuam a perder cerca de 70 animais por dia, segundo Cavalcante.
Autores do texto
Para a acadêmica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, Mara Silva Alexandre Costa, o encaminhamento da mensagem recebida em 2004 significa uma dor de cabeça que dura até hoje, segundo ela. "Eu li e achei estranho, mas repassei sem conferir se era verdade. Minha assinatura eletrônica ficou no email e um mês depois pessoas começaram a pergunta se eu tinha escrito o texto", diz ela.
Desde então, o nome de Mara circula junto com a mensagem. De acordo com ela, diversas instituições já a procuraram para saber a origem da mensagem, entre elas a Funai, o Greenpeace, a Presidência e até a Polícia Federal. "Hoje não repasso mais nada e não tenho e-mail institucional. Sempre quis ir para a Amazônia por vontade de conhecer. Mas, com essa situação que se repete, fico até com medo de ir", explica Mara.
Já o pesquisador da Unicamp Celso Luiz Borges de Oliveira afirmou ter repassado o e-mail também, em 2004. "Já recebi mais de mil e-mails e telefonemas de pessoas me pedindo confirmação", diz ele.
Veja outros exemplos de informações falsas do e-mail esclarecidos pela reportagem com a ajuda de Vicente de Paulo, chefe do IBGE em Roraima:
1. Trecho do email: "Para começar o mais difícil de encontrar por aqui é roraimense, pra falar a verdade, acho que a proporção é de um roraimense para cada 10 pessoas é bem razoável."
IBGE: Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2008 do IBGE, 54,1% da população do estado nasceu em Roraima.
2. Trecho do email: "Aqui não existem muitos meios de sobrevivência, ou a pessoa é funcionária pública, e aqui quase todo mundo é, pois em Boa Vista se concentram todos os órgãos federais e estaduais de Roraima."
IBGE: Segundo a Pnad de 2008, 16,5% das pessoas ocupadas em Roraima são funcionários públicos e estatutários.
3. Trecho do email: "Não existe indústria de qualquer tipo."
IBGE: A indústria de Roraima responde por 11,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado, que em 2007 representou R$ 4,1 milhões.
4. Trecho do email: "Pouco mais de 70% do território roraimense é demarcado como reserva indígena."
Segundo a Funai de Roraima, cerca de 46% da área total do estado é ocupada por terras indígenas. O estado tem pouco mais de 224 mil quilômetros quadrados.
Lucas Frasão do Globo Amazônia, em São Paulo, no G1
Mas não é verdade que brasileiros são impedidos de passar por ali, segundo Marcelo Cavalcante, um dos diretores da Associação Comunidade Waimiri Atroari. "Chamamos o bloqueio de interrupção seletiva. Todos os dias, das 18h30 às 5h30, os indígenas fecham a estrada para proteger os animais que têm hábito noturno e servem de alimento para a comunidade", diz ele.
Os indígenas permitem a passagem de ônibus, caminhões com material perecível, ambulância e autoridades que estejam a serviço, mas mesmo assim continuam a perder cerca de 70 animais por dia, segundo Cavalcante.
Autores do texto
Para a acadêmica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, Mara Silva Alexandre Costa, o encaminhamento da mensagem recebida em 2004 significa uma dor de cabeça que dura até hoje, segundo ela. "Eu li e achei estranho, mas repassei sem conferir se era verdade. Minha assinatura eletrônica ficou no email e um mês depois pessoas começaram a pergunta se eu tinha escrito o texto", diz ela.
Desde então, o nome de Mara circula junto com a mensagem. De acordo com ela, diversas instituições já a procuraram para saber a origem da mensagem, entre elas a Funai, o Greenpeace, a Presidência e até a Polícia Federal. "Hoje não repasso mais nada e não tenho e-mail institucional. Sempre quis ir para a Amazônia por vontade de conhecer. Mas, com essa situação que se repete, fico até com medo de ir", explica Mara.
Já o pesquisador da Unicamp Celso Luiz Borges de Oliveira afirmou ter repassado o e-mail também, em 2004. "Já recebi mais de mil e-mails e telefonemas de pessoas me pedindo confirmação", diz ele.
Veja outros exemplos de informações falsas do e-mail esclarecidos pela reportagem com a ajuda de Vicente de Paulo, chefe do IBGE em Roraima:
1. Trecho do email: "Para começar o mais difícil de encontrar por aqui é roraimense, pra falar a verdade, acho que a proporção é de um roraimense para cada 10 pessoas é bem razoável."
IBGE: Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2008 do IBGE, 54,1% da população do estado nasceu em Roraima.
2. Trecho do email: "Aqui não existem muitos meios de sobrevivência, ou a pessoa é funcionária pública, e aqui quase todo mundo é, pois em Boa Vista se concentram todos os órgãos federais e estaduais de Roraima."
IBGE: Segundo a Pnad de 2008, 16,5% das pessoas ocupadas em Roraima são funcionários públicos e estatutários.
3. Trecho do email: "Não existe indústria de qualquer tipo."
IBGE: A indústria de Roraima responde por 11,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado, que em 2007 representou R$ 4,1 milhões.
4. Trecho do email: "Pouco mais de 70% do território roraimense é demarcado como reserva indígena."
Segundo a Funai de Roraima, cerca de 46% da área total do estado é ocupada por terras indígenas. O estado tem pouco mais de 224 mil quilômetros quadrados.
Lucas Frasão do Globo Amazônia, em São Paulo, no G1
sábado, 12 de junho de 2010
Greve no Tribunal de Justiça de São Paulo
Quem levar um pedaço de pão com manteiga para eles (ocupantes) está me desobedecendo”, palavras do desembargador Viana Santos
DEPOIS DE 48 HORAS
Por deliberação própria, servidores desocupam o Fórum João Mendes
Após sucessivas reuniões, os 74 servidores que se encontravam no interior desde a última quarta-feira, dia 9 de junho, deliberaram por desocupar o prédio. A saída aconteceu por volta das 12h30, sob aplausos, palavras de ordem e emoção parte dos mais de mil servidores que aguardavam, na parte externa do prédio. No decorrer da ocupação, vários foram os servidores que passaram por avaliação e atendimento medico, em razão do enorme desgaste.
CONFRATERNIZAÇÃO E CAFÉ DA MANHÃ – Servidores se abraçaram e muitos deles, sob um clima de muita emoção, não conseguiram conter as lágrimas. Um café da manhã e uma saborosa sopa servida pela ASSETJ em seu restaurante próprio, na rua Conselheiro Furtado, foram servidos àqueles que permaneceram por cerca de 48 horas sem nenhuma refeição.
OBJETIVO DA MOBILIZAÇÃO - A finalidade única e exclusiva da ocupação do Fórum João Mendes foi reabrir as negociações da categoria junto ao Tribunal de Justiça, no tocante a discussão da determinação contida no Comunicado SGRH 56/2010, que determina a colocação de faltas injustificadas aos servidores grevistas, quando o correto é greve, o que certamente deverá culminar em zerar o salário dos servidores.
VISTORIA DO PRÉDIO - Vale ressaltar que, momentos antes da desocupação, mediante solicitação dos servidores, as dependências que foram ocupadas no prédio foram todas vistoriados por juízes assessores e policiais militares, oportunidade em que puderam constatar quando a integridade física do prédio.
ATO PÚBLICO – Após o breve café da manhã, os servidores que estavam no interior do prédio já se posicionam para dar seu testemunho quanto aos fatos ocorridos nos últimos dias, como por exemplo, a determinação da Egrégia Presidência de proibir a entrada de qualquer alimento ou água potável, uma vez que os servidores tiveram que sobreviver com a água existente na pia dos banheiros.
DEPOIMENTOS EMOCIONADOS - O que não faltaram foram depoimentos emocionados dos servidores que estiveram isolados dos seus companheiros de cartório, dos seus familiares e de toda a sociedade.
PROIBIÇÃO DA ENTRADA DE ALIMENTOS - Em momento algum foi permitido pela administração do TJ/SP, o ingresso de alimentos, uma vez que a Egrégia Presidência, representada por um conjunto de juízes auxiliares, pelas diversas vezes reunida com os servidores que se encontravam no interior do prédio João Mendes, fez questão de frisar a frase: “Quem levar um pedaço de pão com manteiga para eles (ocupantes) está me desobedecendo”, palavras do desembargador Viana Santos, anunciadas em alto e bom som pelo juiz assessor João Batista Rebouças de Carvalho.
PARLAMENTARES PRESENTES - Nas reuniões com os membros da Comissão de Negociação Representativas dos Servidores, se fizeram presentes os parlamentares estaduais Major Olímpio, Jose Cândido, Carlos Giannazi, presidente da Comissão de Direitos Humanos, além da última que contou com a presença do deputado federal Ivan Valente, os quais fizeram ás vezes de intermediadores, sempre em busca de diálogo, a quem desde já a Diretoria da ASSOJURIS externa seus mais sinceros agradecimentos.
SENADOR PRESENTE - Ainda no que diz respeito á presença de parlamentares, no ato de desocupação se fez presente o Senador da República, Eduardo Suplicy, que, num primeiro momento, foi impedido de ingressar no prédio do Fórum João Mendes, sob a argumentação da necessidade de autorização expressa da Presidência do TJ/SP, permissão essa que se concretizou em meio ao ato desocupatório.
IMPRENSA PRESENTE - No decorrer da assembléia realizada depois da desocupação, se fizeram presentes um grande número de profissionais dos mais diversos veículos de comunicação que, aliás, nos últimos dias, divulgaram de forma maciça o nosso movimento. Como não poderia deixar de ser, um enorme número de servidores presentes, tanto do interior, quando da capital paulista, deliberaram pela continuidade do acampamento montado na Praça localizada em frente ao Fórum João Mendes.
SERVIDORES EM VIGÍLIA - Uma outra situação que não pode ser destacada neste momento é a presença maciça dos servidores que se encontravam do lado externo do prédio. Servidores estes que passaram frio e, porque não fizer até mesmo fome, o que seu deu não pela ausência de alimento disponibilizado pelas entidades presentes, mas numa grande parcela das vezes em respeito e solidariedade àqueles companheiros que passavam fome e sede de água potável no interior do prédio ocupado.
VERDADEIROS HERÓIS - No momento da publicação desta matéria, ainda não é possível nominar àqueles que junto com o Presidente da ASSOJURIS, Antônio Carlos Capela Novas, Presidente da ASSOJUBS, Hugo Coviello, vários diretores, delegados, representantes de ambas as entidades e demais servidores militantes da categoria permaneceram no interior do edifício por cerca de 48 horas. Nomes estes que deverão ser elencados, um a um, nos próximos dias, em respeito á unidade do movimento.
VIGÍLIA MANTIDA NA PRAÇA JOÃO MENDES - Quanto á vigília, a mesma será mantida pelos servidores residentes na Capital e Grande São Paulo, os quais lá permanecerão até segunda-feira pela manhã, onde serão rendidos por servidores residentes em Santos, São Vicente, Praia Grande e demais cidades do Litoral Sul, os quais por sua vez serão substituídos pelos servidores de São José do Rio Preto, Catanduva, Mirassol, Monte Aprazível, Jales e demais cidades da região.
Já na quarta-feira, dia 16 de junho, data da próxima Assembléia Geral, deverão assumir a vigília os servidores de Mococa, somados ás Assistentes Sociais e Psicólogas de todo o Estado. No complemento da semana, podemos adiantar que as regiões de Assis, Ourinhos, Xavantes, Cândido Mota, Dracena, Andradina, Araçatuba, dentre inúmeras outras, deverão se “entrincheirarem” em defesa da causa.
Ribeirão Preto, Campinas e todas as demais regiões também terão participação efetiva na manutenção da vigília, cujo calendário deverá ser elaborado nos próximos dias, em face do enorme número de cidades dispostas a participarem de mais este ato reivindicatório.
Por deliberação própria, servidores desocupam o Fórum João Mendes
Após sucessivas reuniões, os 74 servidores que se encontravam no interior desde a última quarta-feira, dia 9 de junho, deliberaram por desocupar o prédio. A saída aconteceu por volta das 12h30, sob aplausos, palavras de ordem e emoção parte dos mais de mil servidores que aguardavam, na parte externa do prédio. No decorrer da ocupação, vários foram os servidores que passaram por avaliação e atendimento medico, em razão do enorme desgaste.
CONFRATERNIZAÇÃO E CAFÉ DA MANHÃ – Servidores se abraçaram e muitos deles, sob um clima de muita emoção, não conseguiram conter as lágrimas. Um café da manhã e uma saborosa sopa servida pela ASSETJ em seu restaurante próprio, na rua Conselheiro Furtado, foram servidos àqueles que permaneceram por cerca de 48 horas sem nenhuma refeição.
OBJETIVO DA MOBILIZAÇÃO - A finalidade única e exclusiva da ocupação do Fórum João Mendes foi reabrir as negociações da categoria junto ao Tribunal de Justiça, no tocante a discussão da determinação contida no Comunicado SGRH 56/2010, que determina a colocação de faltas injustificadas aos servidores grevistas, quando o correto é greve, o que certamente deverá culminar em zerar o salário dos servidores.
VISTORIA DO PRÉDIO - Vale ressaltar que, momentos antes da desocupação, mediante solicitação dos servidores, as dependências que foram ocupadas no prédio foram todas vistoriados por juízes assessores e policiais militares, oportunidade em que puderam constatar quando a integridade física do prédio.
ATO PÚBLICO – Após o breve café da manhã, os servidores que estavam no interior do prédio já se posicionam para dar seu testemunho quanto aos fatos ocorridos nos últimos dias, como por exemplo, a determinação da Egrégia Presidência de proibir a entrada de qualquer alimento ou água potável, uma vez que os servidores tiveram que sobreviver com a água existente na pia dos banheiros.
DEPOIMENTOS EMOCIONADOS - O que não faltaram foram depoimentos emocionados dos servidores que estiveram isolados dos seus companheiros de cartório, dos seus familiares e de toda a sociedade.
PROIBIÇÃO DA ENTRADA DE ALIMENTOS - Em momento algum foi permitido pela administração do TJ/SP, o ingresso de alimentos, uma vez que a Egrégia Presidência, representada por um conjunto de juízes auxiliares, pelas diversas vezes reunida com os servidores que se encontravam no interior do prédio João Mendes, fez questão de frisar a frase: “Quem levar um pedaço de pão com manteiga para eles (ocupantes) está me desobedecendo”, palavras do desembargador Viana Santos, anunciadas em alto e bom som pelo juiz assessor João Batista Rebouças de Carvalho.
PARLAMENTARES PRESENTES - Nas reuniões com os membros da Comissão de Negociação Representativas dos Servidores, se fizeram presentes os parlamentares estaduais Major Olímpio, Jose Cândido, Carlos Giannazi, presidente da Comissão de Direitos Humanos, além da última que contou com a presença do deputado federal Ivan Valente, os quais fizeram ás vezes de intermediadores, sempre em busca de diálogo, a quem desde já a Diretoria da ASSOJURIS externa seus mais sinceros agradecimentos.
SENADOR PRESENTE - Ainda no que diz respeito á presença de parlamentares, no ato de desocupação se fez presente o Senador da República, Eduardo Suplicy, que, num primeiro momento, foi impedido de ingressar no prédio do Fórum João Mendes, sob a argumentação da necessidade de autorização expressa da Presidência do TJ/SP, permissão essa que se concretizou em meio ao ato desocupatório.
IMPRENSA PRESENTE - No decorrer da assembléia realizada depois da desocupação, se fizeram presentes um grande número de profissionais dos mais diversos veículos de comunicação que, aliás, nos últimos dias, divulgaram de forma maciça o nosso movimento. Como não poderia deixar de ser, um enorme número de servidores presentes, tanto do interior, quando da capital paulista, deliberaram pela continuidade do acampamento montado na Praça localizada em frente ao Fórum João Mendes.
SERVIDORES EM VIGÍLIA - Uma outra situação que não pode ser destacada neste momento é a presença maciça dos servidores que se encontravam do lado externo do prédio. Servidores estes que passaram frio e, porque não fizer até mesmo fome, o que seu deu não pela ausência de alimento disponibilizado pelas entidades presentes, mas numa grande parcela das vezes em respeito e solidariedade àqueles companheiros que passavam fome e sede de água potável no interior do prédio ocupado.
VERDADEIROS HERÓIS - No momento da publicação desta matéria, ainda não é possível nominar àqueles que junto com o Presidente da ASSOJURIS, Antônio Carlos Capela Novas, Presidente da ASSOJUBS, Hugo Coviello, vários diretores, delegados, representantes de ambas as entidades e demais servidores militantes da categoria permaneceram no interior do edifício por cerca de 48 horas. Nomes estes que deverão ser elencados, um a um, nos próximos dias, em respeito á unidade do movimento.
VIGÍLIA MANTIDA NA PRAÇA JOÃO MENDES - Quanto á vigília, a mesma será mantida pelos servidores residentes na Capital e Grande São Paulo, os quais lá permanecerão até segunda-feira pela manhã, onde serão rendidos por servidores residentes em Santos, São Vicente, Praia Grande e demais cidades do Litoral Sul, os quais por sua vez serão substituídos pelos servidores de São José do Rio Preto, Catanduva, Mirassol, Monte Aprazível, Jales e demais cidades da região.
Já na quarta-feira, dia 16 de junho, data da próxima Assembléia Geral, deverão assumir a vigília os servidores de Mococa, somados ás Assistentes Sociais e Psicólogas de todo o Estado. No complemento da semana, podemos adiantar que as regiões de Assis, Ourinhos, Xavantes, Cândido Mota, Dracena, Andradina, Araçatuba, dentre inúmeras outras, deverão se “entrincheirarem” em defesa da causa.
Ribeirão Preto, Campinas e todas as demais regiões também terão participação efetiva na manutenção da vigília, cujo calendário deverá ser elaborado nos próximos dias, em face do enorme número de cidades dispostas a participarem de mais este ato reivindicatório.
RIBEIRÃO PRETO 100% - Por mais um dia, nesta sexta-feira, dia 11 de junho, os servidores do Fórum de Ribeirão Preto deliberam pela suspensão total dos trabalhos forenses, o que certamente deverá ocasionar uma nova suspensão dos prazos processuais. Deliberação essa que foi comunicada de imediato no Ato Público de desocupação ocorrido em São Paulo.
DISSÍDIO COLETIVO POR GREVE – Em meio a todos esses atropelos, o Desembargador Hamilton Elliot Akel, designou “mais uma audiência” de tentativa de conciliação no processo do Dissídio Coletivo por greve para o próximo dia 17 de junho, ás 10 horas.
Fonte: http://www.assojuris.com.br/
Fonte: http://www.assojuris.com.br/
Incesto é 'comum' e não é denunciado
Incesto é 'comum' e não é denunciado, dizem especialistas G1 ouviu estudiosos sobre caso de jovem que teve 7 filhos do pai no MA.
Somente isolamento e falta de condições sociais não levam ao incesto.
Luciana Rossetto Do G1, em São Paulo
Somente isolamento e falta de condições sociais não levam ao incesto.
Luciana Rossetto Do G1, em São Paulo
Pescador teve sete filhos com a própria filha
(Foto: Divulgação/Polícia Civil do Maranhão)
Isolamento, falta de acesso à educação e condições sociais precárias. A soma de todos esses fatores poderia explicar o caso do pescador que teve sete filhos com a própria filha no povoado de Extremo, em Pinheiro (MA). No entanto, especialistas ouvidos pelo G1 afirmam que tudo isso não justifica o abuso, mas colabora para que ele ocorra. Eles chegam a afirmar que em algumas regiões do interior do Brasil é um costume os homens iniciarem sexualmente as filhas.(Foto: Divulgação/Polícia Civil do Maranhão)
O psiquiatra José Raimundo da Silva Lippi, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade de São Paulo (USP), explica que somente o isolamento não leva a uma conduta incestuosa, mas a falta de contato com a sociedade colaborou para o incesto.
“Dentro de cada pai incestuoso, existe algo não resolvido, que o faz buscar a solução para seu desejo sexual com uma criança ou o próprio filho. Ele age ainda como uma pessoa primitiva em termos de desenvolvimento afetivo”, afirmou.
Dentro de cada pai incestuoso existe algo não resolvido, que o faz buscar a solução para seu desejo sexual com uma criança ou o próprio filho"
José Raimundo da Silva Lippi, psiquiatra
“Todos nascemos instintivos, mas conforme vamos nos desenvolvendo, criamos estruturas que nos permitem interromper pensamentos que ocorrem. Não é proibido um pai ter desejo ao ver uma filha, mas o pai com desenvolvimento afetivo adequado tira o pensamento da cabeça e não concretiza o ato. Já o pai instintivo vê a filha como objeto sexual e não tem essa lei interior que o ajuda a conter esses impulsos. O lugar ermo pode ter dificultado o mecanismo de contenção interior, então ele se sentiu mais livre para isso, sem regras sociais que o impedissem”, disse.
Casa onde pescador vivia tem dois cômodos e fica afastada do Centro de Pinheiro
(Foto: Divulgação/Polícia Civil do Maranhão)
A cientista social Sandra Nascimento, pesquisadora do programa de Cultura e Sociedade da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), destaca que o pescador falou com naturalidade sobre o incesto após a prisão. “O fato de ele viver isolado, sem controle, contribuiu para o que aconteceu. Até pelas condições de miséria em que vivia, ele não tem dimensão social do horror que causou com o incesto. Talvez, ele tenha considerado que é algo natural para todos os homens, que desejam e têm as mulheres”, explicou.Sandra também vê aspectos semelhantes entre os casos do Brasil e da Áustria. “Tanto no caso da Áustria quanto no brasileiro, há uma relação de poder muito forte. Existe a questão de querer dominar a filha, que é vista como propriedade. Eles quiseram possuir as meninas e subjugá-las aos seus domínios. Nós nos horrorizamos, porque, pelas normas, pai é proteção”, disse.
Existe a questão de querer dominar a filha, que é vista como propriedade"
Sandra Nascimento, cientista social
De acordo com o antropólogo, o incesto não é aceito na maioria das culturas. “Os casos não são legitimados e, quando ocorrem, os indivíduos são penalizados. Agora, existem relatos de homens que não têm possibilidade de buscar uma companheira para estabelecer uma relação conjugal que seja fora da própria família. Isso faz com que, muitas vezes, sujeitos pratiquem atos incestuosos”, disse.
Em quase todas as culturas é proibido ter relação dentro de um grupo íntimo de parentesco"
José Rogério Lopes, antropólogo
De acordo com Lippi, em algumas regiões do interior do Brasil, é um costume os homens iniciarem sexualmente as filhas. “Existe a idéia de que o pai sabe mais sobre as coisas do mundo. Em determinada região do Tocantins, por exemplo, há relatos de meninas que passam por isso, porque é algo visto como ‘obrigação de pai’.”
O médico conta que assim surgiram os filhos dos botos, que seriam, na verdade, fruto do relacionamento incestuoso entre pais e filhas. “Criou-se uma lenda para tirar a culpa dos pais e justificar a gravidez das jovens. Então, surgiu a história de que as crianças são filhas de um boto”, diz.
Sandra também relata que esse tipo de caso é comum no interior do Maranhão. “Pais dizem que eles vão ter as filhas primeiro, porque elas não serão de outro homem sem ser primeiro deles. É uma dominação de gênero. O homem quer ter a posse da mulher. A vítima se sente ameaçada e, ao mesmo tempo, não consegue reagir contra o próprio pai. Acontece muito, mas é algo que tem pouca visibilidade.”Criou-se uma lenda para tirar a culpa dos pais e justificar a gravidez das jovens. Então, surgiu a história de que as crianças são filhas de um boto"
José Raimundo da Silva Lippi, psiquiatra
Denúncias
O psiquiatra acredita que, quando situações como essa são descobertas, a população tem um incentivo maior para denunciar casos de abuso. “A tendência é que a comunidade não permita mais. Se isso chega à comunidade como algo proibido, então a cultura do local pode mudar”, diz.
sábado, 5 de junho de 2010
Cientistas responsabilizam celular por desaparecimento de abelhas
O desaparecimento de abelhas que alarmou a Europa e a América do Norte está sendo creditado, por alguns cientistas, ao crescimento do uso dos celulares, segundo o site do jornal britânico "Daily Telegraph".
De acordo com o site, a Grã Bretanha teve uma queda de 15% na sua população de abelhas nos últimos dois anos.
De acordo com o site, a Grã Bretanha teve uma queda de 15% na sua população de abelhas nos últimos dois anos.
Pesquisadores da Universidade Punjab dizem que a radiação dos telefones celulares é um fator chave no desaparecimento e alegam que isso está envolvendo nos sentidos de navegação das abelhas.
Segundo o "Daily Telegraph", os cientistas fizeram um experimento durante três meses e compararam a situação das abelhas que estavam coexistindo com os celulares com as que não estavam.
As que estavam no ambiente com radiação de celular tiveram uma queda dramática no tamanho de sua colmeia e redução do número de ovos postos pela abelha rainha.
As abelhas também pararam de produzir mel.
Da Folha.com
sexta-feira, 4 de junho de 2010
A caminho de um Estado policialesco
O Brasil parece andar para trás. Enquanto, no mundo inteiro, a tecnologia vem trazendo avanços inimagináveis às investigações policiais, tornando-as mais eficientes, os nossos legisladores, com a sanção do presidente Lula, deram um prêmio à morosidade policial brasileira, fomentando a instituição de um Estado policialesco, em desfavor da cidadania, com a edição da Lei n.º 12.234, do dia 5 de maio, que alterou a prescrição durante as investigações policiais.
A prescrição impõe ao Estado um prazo máximo para perseguir pessoas acusadas de um crime, havendo, em nossa Constituição, somente duas exceções: o crime de racismo e a ação de grupos armados contra o Estado democrático. O Estatuto de Roma também tornou imprescritível o crime de tortura praticado durante ataque generalizado ou sistemático contra qualquer população civil.
A prescrição impõe ao Estado um prazo máximo para perseguir pessoas acusadas de um crime, havendo, em nossa Constituição, somente duas exceções: o crime de racismo e a ação de grupos armados contra o Estado democrático. O Estatuto de Roma também tornou imprescritível o crime de tortura praticado durante ataque generalizado ou sistemático contra qualquer população civil.
Embora existam críticos afirmando que a prescrição seria um prêmio para o criminoso pela ineficiência estatal, uma recompensa para o que fugiu, castigando duramente o que não soube ou não quis fugir, ela é fundamental em toda democracia.
Isso porque os prazos prescricionais impõem que o Estado efetivamente se movimente para investigar crimes, sob pena de perder o poder de fazê-lo, diminuindo assim as chances de erro judiciário, já que, com o tempo, as provas vão se tornando mais frágeis. A prescrição evita, também, que cidadãos sejam eternamente perseguidos, mesmo porque, como dizia Rui Barbosa, "justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta", perdendo o sentido. Tudo em respeito à vítima e a seus familiares, à sociedade e até mesmo ao próprio cidadão investigado, presumido inocente, que têm, todos, o direito a um julgamento em prazo razoável.
Sem o devido debate, essa lei acabou com o curso do prazo prescricional para as investigações policiais com base na pena que, concretamente, venha a ser aplicada em futura condenação. É a chamada prescrição retroativa (artigo 110 do Código Penal).
Isso porque os prazos prescricionais impõem que o Estado efetivamente se movimente para investigar crimes, sob pena de perder o poder de fazê-lo, diminuindo assim as chances de erro judiciário, já que, com o tempo, as provas vão se tornando mais frágeis. A prescrição evita, também, que cidadãos sejam eternamente perseguidos, mesmo porque, como dizia Rui Barbosa, "justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta", perdendo o sentido. Tudo em respeito à vítima e a seus familiares, à sociedade e até mesmo ao próprio cidadão investigado, presumido inocente, que têm, todos, o direito a um julgamento em prazo razoável.
Sem o devido debate, essa lei acabou com o curso do prazo prescricional para as investigações policiais com base na pena que, concretamente, venha a ser aplicada em futura condenação. É a chamada prescrição retroativa (artigo 110 do Código Penal).
A partir de agora, cidadãos podem ser investigados pela polícia, sem prescrição, por mais de uma década depois da data do suposto crime, violando-se a garantia constitucional de julgamento em prazo razoável.
Assim, se a pena máxima do crime for superior a quatro anos (como no caso de estelionato, cuja pena é de um a cinco anos), o inquérito policial poderá arrastar-se por até 12 anos; se a pena máxima for de oito anos (de que é exemplo um simples crime de furto com emprego de chave falsa, rompimento de obstáculo, abuso de confiança ou mediante concurso de duas pessoas, cuja pena é de dois a oito anos), poderão ser 16 anos de inquérito!
Tratando-se dos crimes mais graves, com pena máxima acima de 12 anos, as investigações policiais poderão durar 20 anos, o que é um despropósito, já que, nesses casos, estamos diante de delitos que, justamente pela sua gravidade, merecem empenho ainda maior da polícia, o que não é compatível com duas décadas de investigação.
Tudo sem prescrição, ainda que a pessoa acabe sendo condenada por uma pena inferior à máxima, com prazo prescricional muito menor.
A verdade nua e crua é que com a Lei n.º 12.234 se deu à Polícia Federal e às polícias estaduais poder para perseguir cidadãos por muito mais tempo do que podem durar as próprias ações penais. Isso porque, para os juízes, continua a existir a prescrição retroativa com base na pena aplicada, demandando deles um mínimo de agilidade nos processos, em prol da cidadania.
Essa alteração legislativa atinge também as investigações que o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos Estaduais têm feito mediante os chamados Procedimentos Criminais Diversos, cuja constitucionalidade está pendente de julgamento na Suprema Corte.
Nesses moldes, a polícia e o Ministério Público não têm mais preocupação com a prescrição. Todos poderão demorar décadas para apurar a autoria e a materialidade de uma infração penal, seja mediante o tradicional inquérito policial, seja por meio dos aludidos procedimentos investigatórios.
Ora, se os inquéritos policiais já se arrastavam pelos escaninhos das delegacias de polícia e dos Fóruns por anos, com a ameaça da prescrição - que impunha, bem ou mal, ao menos uma preocupação dos promotores de Justiça e dos procuradores da República em cobrar da polícia o término das investigações -, agora, com a nova regra, é que os inquéritos não vão andar mesmo. Igualmente, os procedimentos criminais diversos do próprio Ministério Público poderão arrastar-se por décadas.
Lamentamos que, sob o discurso de evitar a impunidade, em vez de se aparelhar a polícia e dela exigir eficiência, se tenha concedido verdadeiro estímulo à letargia policial, somado ao excesso de poder no tempo. O mesmo se aplica ao Ministério Público, que, a partir de agora, poderá demorar 12, 16 ou até 20 anos para oferecer uma denúncia!
É a inversão de tudo, e com ofensa ao direito dos cidadãos, presumidos inocentes, de serem julgados em prazo razoável, como manda a Constituição.
Afinal, não tem cabimento o delegado de polícia e o Ministério Público poderem demorar muito mais tempo para terminar uma investigação e oferecer denúncia do que o juiz para julgar um processo. Processo criminal, este, muito mais complexo do que uma investigação, por exigir ampla defesa e contraditório.
É fundamental estarmos atentos, e de olhos bem abertos, para que modelo de controle social desejamos para o Brasil de amanhã, sobretudo por estar em trâmite legislativo um novo Código de Processo Penal.
O atual governo, pela força dada à Polícia Federal, de que também é exemplo essa grande ampliação dos prazos para os inquéritos policiais, tem corrido o risco, a cada dia que passa maior, da instituição, em nosso país, de um Estado policialesco.
Texto de Roberto Delmanto Junior, advogado, professor da FGV, coautor do "Código Penal Comentado" (2010), conselheiro da OAB-SP, n' O Estado de São Paulo de 02/06/10.
Assim, se a pena máxima do crime for superior a quatro anos (como no caso de estelionato, cuja pena é de um a cinco anos), o inquérito policial poderá arrastar-se por até 12 anos; se a pena máxima for de oito anos (de que é exemplo um simples crime de furto com emprego de chave falsa, rompimento de obstáculo, abuso de confiança ou mediante concurso de duas pessoas, cuja pena é de dois a oito anos), poderão ser 16 anos de inquérito!
Tratando-se dos crimes mais graves, com pena máxima acima de 12 anos, as investigações policiais poderão durar 20 anos, o que é um despropósito, já que, nesses casos, estamos diante de delitos que, justamente pela sua gravidade, merecem empenho ainda maior da polícia, o que não é compatível com duas décadas de investigação.
Tudo sem prescrição, ainda que a pessoa acabe sendo condenada por uma pena inferior à máxima, com prazo prescricional muito menor.
A verdade nua e crua é que com a Lei n.º 12.234 se deu à Polícia Federal e às polícias estaduais poder para perseguir cidadãos por muito mais tempo do que podem durar as próprias ações penais. Isso porque, para os juízes, continua a existir a prescrição retroativa com base na pena aplicada, demandando deles um mínimo de agilidade nos processos, em prol da cidadania.
Essa alteração legislativa atinge também as investigações que o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos Estaduais têm feito mediante os chamados Procedimentos Criminais Diversos, cuja constitucionalidade está pendente de julgamento na Suprema Corte.
Nesses moldes, a polícia e o Ministério Público não têm mais preocupação com a prescrição. Todos poderão demorar décadas para apurar a autoria e a materialidade de uma infração penal, seja mediante o tradicional inquérito policial, seja por meio dos aludidos procedimentos investigatórios.
Ora, se os inquéritos policiais já se arrastavam pelos escaninhos das delegacias de polícia e dos Fóruns por anos, com a ameaça da prescrição - que impunha, bem ou mal, ao menos uma preocupação dos promotores de Justiça e dos procuradores da República em cobrar da polícia o término das investigações -, agora, com a nova regra, é que os inquéritos não vão andar mesmo. Igualmente, os procedimentos criminais diversos do próprio Ministério Público poderão arrastar-se por décadas.
Lamentamos que, sob o discurso de evitar a impunidade, em vez de se aparelhar a polícia e dela exigir eficiência, se tenha concedido verdadeiro estímulo à letargia policial, somado ao excesso de poder no tempo. O mesmo se aplica ao Ministério Público, que, a partir de agora, poderá demorar 12, 16 ou até 20 anos para oferecer uma denúncia!
É a inversão de tudo, e com ofensa ao direito dos cidadãos, presumidos inocentes, de serem julgados em prazo razoável, como manda a Constituição.
Afinal, não tem cabimento o delegado de polícia e o Ministério Público poderem demorar muito mais tempo para terminar uma investigação e oferecer denúncia do que o juiz para julgar um processo. Processo criminal, este, muito mais complexo do que uma investigação, por exigir ampla defesa e contraditório.
É fundamental estarmos atentos, e de olhos bem abertos, para que modelo de controle social desejamos para o Brasil de amanhã, sobretudo por estar em trâmite legislativo um novo Código de Processo Penal.
O atual governo, pela força dada à Polícia Federal, de que também é exemplo essa grande ampliação dos prazos para os inquéritos policiais, tem corrido o risco, a cada dia que passa maior, da instituição, em nosso país, de um Estado policialesco.
Texto de Roberto Delmanto Junior, advogado, professor da FGV, coautor do "Código Penal Comentado" (2010), conselheiro da OAB-SP, n' O Estado de São Paulo de 02/06/10.
quarta-feira, 2 de junho de 2010
A "outra China"
A China não caberá na China! Não há água, não há solo, não há energia no território chinês para sustentá-lo. Ela precisará de outra China!
O Partido Comunista Chinês desenvolve uma política de acomodação para manter o controle interno. E pensa 40 anos à frente para prosseguir no seu bem-sucedido programa de desenvolvimento.
Testemunhas verazes mostram que na China o debate de ideias em ambiente fechado (na academia) é relativamente livre. A situação muda radicalmente quando a contestação é pública ou organiza o pensamento dissidente. Até quando esse mecanismo vai funcionar numa sociedade cuja afluência cresce a olhos vistos, é uma questão em aberto.
Sobre o que se tem certeza é que os recursos naturais da China não serão capazes de sustentar a produção de bens e serviços necessários para uma população de 1,7 bilhão em 2050 (se a população crescer à taxa de 0,5% ao ano) com uma renda per capita da ordem de US$ 71 mil -em dólares de 2009 (se o crescimento per capita for de apenas 6%).
Isso, grosseiramente, representa quase 1,7 vez o PIB mundial de 2009! Sua simples menção mostra que, com sua população e seu "projetado" crescimento, a China não caberá na China! Não há água, não há solo, não há energia no território chinês para sustentá-lo. Ela precisará de outra China!
É exatamente isto o que ela está fazendo: transformando as suas extraordinárias reservas de dólares (mais de US$ 2,5 trilhões) em ativos reais.
Compra na América Latina e na África terras para cultivar cereais (e eventualmente biocombustíveis) e explorar recursos minerais (minério de ferro, cobre etc.).
Empresta a empresas petrolíferas com garantia de suprimento. O mesmo que fizeram as velhas metrópoles nas suas colônias e no mundo emergente. Mas há uma diferença importante: a exploração colonial era intermediada por empresas privadas sob a tutela soberana.
No caso da China, é o próprio Estado soberano que, por intermédio de empresas estatais, se apropria (pela compra ou por empréstimo) de ativos reais em outros países soberanos. É a isso que assistimos diariamente no Brasil!
Mas por que essa preocupação? Primeiro, porque é duvidoso que isso não viole a nossa Constituição.
Segundo, porque poderá vir a constituir uma limitação ao exercício de nossa política econômica, o que, eventualmente, poderá gerar graves contenciosos diplomáticos.
E, terceiro, porque, no longo prazo, oferecerá vantagem comparativa à China, que, sem intermediação dos mercados, fará uma ligação direta entre o suprimento e a sua demanda, certamente abaixo dos preços internacionais e em prejuízo do país fornecedor colonizado.
ANTONIO DELFIM NETTO na Folha de São Paulo de 02/06/10
O Partido Comunista Chinês desenvolve uma política de acomodação para manter o controle interno. E pensa 40 anos à frente para prosseguir no seu bem-sucedido programa de desenvolvimento.
Testemunhas verazes mostram que na China o debate de ideias em ambiente fechado (na academia) é relativamente livre. A situação muda radicalmente quando a contestação é pública ou organiza o pensamento dissidente. Até quando esse mecanismo vai funcionar numa sociedade cuja afluência cresce a olhos vistos, é uma questão em aberto.
Sobre o que se tem certeza é que os recursos naturais da China não serão capazes de sustentar a produção de bens e serviços necessários para uma população de 1,7 bilhão em 2050 (se a população crescer à taxa de 0,5% ao ano) com uma renda per capita da ordem de US$ 71 mil -em dólares de 2009 (se o crescimento per capita for de apenas 6%).
Isso, grosseiramente, representa quase 1,7 vez o PIB mundial de 2009! Sua simples menção mostra que, com sua população e seu "projetado" crescimento, a China não caberá na China! Não há água, não há solo, não há energia no território chinês para sustentá-lo. Ela precisará de outra China!
É exatamente isto o que ela está fazendo: transformando as suas extraordinárias reservas de dólares (mais de US$ 2,5 trilhões) em ativos reais.
Compra na América Latina e na África terras para cultivar cereais (e eventualmente biocombustíveis) e explorar recursos minerais (minério de ferro, cobre etc.).
Empresta a empresas petrolíferas com garantia de suprimento. O mesmo que fizeram as velhas metrópoles nas suas colônias e no mundo emergente. Mas há uma diferença importante: a exploração colonial era intermediada por empresas privadas sob a tutela soberana.
No caso da China, é o próprio Estado soberano que, por intermédio de empresas estatais, se apropria (pela compra ou por empréstimo) de ativos reais em outros países soberanos. É a isso que assistimos diariamente no Brasil!
Mas por que essa preocupação? Primeiro, porque é duvidoso que isso não viole a nossa Constituição.
Segundo, porque poderá vir a constituir uma limitação ao exercício de nossa política econômica, o que, eventualmente, poderá gerar graves contenciosos diplomáticos.
E, terceiro, porque, no longo prazo, oferecerá vantagem comparativa à China, que, sem intermediação dos mercados, fará uma ligação direta entre o suprimento e a sua demanda, certamente abaixo dos preços internacionais e em prejuízo do país fornecedor colonizado.
ANTONIO DELFIM NETTO na Folha de São Paulo de 02/06/10
A frota de Gaza e os limites da força
Por 2.000 anos, os judeus só conheciam a força da força em forma das chibatadas que lhes eram aplicadas. Há algumas décadas, porém, nos tornamos capazes de também exercer a força. Seu poder, no entanto, nos embriagou incontáveis vezes. Incontáveis vezes imaginamos que é possível resolver todo grande problema que encontramos por meio da força.
Como diz um provérbio, para o homem que carrega um grande martelo, todo problema tem jeito de prego. No período anterior à fundação do Estado, larga proporção da população judaica na Palestina não compreendia os limites da força e imaginava que fosse possível usá-la para atingir qualquer objetivo.
Por sorte, durante os primeiros anos de Israel, líderes como David Ben Gurion e Levi Eskhol sabiam muito bem que a força tem seus limites e cuidavam em não ultrapassar essas fronteiras.
Mas, desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel sofre de uma fixação pela força militar. O lema é: aquilo que não pode ser realizado pela força pode ser realizado por uma força ainda maior.
O cerco de Israel à faixa de Gaza é um dos fétidos produtos dessa visão. Origina-se da errônea suposição de que o Hamas pode ser derrotado pela força das armas, ou, em termos mais gerais, que o problema palestino pode ser esmagado em lugar de resolvido.
O HAMAS É UMA IDEIA
Mas o Hamas não é apenas uma organização terrorista. O Hamas é uma ideia. Uma ideia desesperada e fanática nascida da desolação e da frustração de muitos palestinos.
E ideia alguma jamais foi derrotada pela força nem por bloqueios, nem por bombardeios, nem soterrada sob as esteiras dos tanques de guerra ou atacada por forças especiais da Marinha. Para derrotar uma ideia é preciso oferecer uma ideia melhor, mais atraente e mais aceitável.
A única maneira de remover o Hamas é que Israel chegue rapidamente a um acordo com os palestinos para o estabelecimento de um Estado independente na Cisjordânia e na faixa de Gaza, tais como definidas pelas fronteiras de 1967, com capital em Jerusalém Oriental. Israel precisa assinar um acordo de paz com Mahmoud Abbas e seu governo e, com isso, reduzir o conflito entre Israel e os palestinos a um conflito entre Israel e a faixa de Gaza.
E o último só poderá ser resolvido, em última análise, pela integração entre o Fatah, de Abbas, e o Hamas. Mesmo que Israel capture uma centena de outros navios rumo a Gaza, mesmo que envie soldados para ocupar Gaza mais uma centena de vezes, não importa quantas vezes Israel use suas Forças Armadas, polícia e forças clandestinas, não haverá como resolver o problema.
NÃO ESTAMOS SÓS
O problema é que não estamos sós nesta terra, e os palestinos não estão sós nesta terra. Não estamos sós em Jerusalém, e os palestinos não estão sós em Jerusalém. Até que nós, israelenses e palestinos, reconheçamos as consequências lógicas desse simples fato, viveremos todos em permanente estado de sítio: Gaza sob sítio israelense, e Israel sob sítio árabe e internacional.
Não desconsidero a importância da força. A força militar é vital para Israel. Sem ela não seríamos capazes de sobreviver nem por um dia. Ai do país que desconsidere a eficácia da força. Mas não podemos nos permitir esquecer nem por um momento que a força só é efetiva de modo preventivo para impedir a destruição de Israel, proteger nossas vidas e nossa liberdade.
Cada tentativa de usar a força não para fins preventivos, ou de autodefesa, e sim como forma de esmagar problemas e esmagar ideias conduzirá a novos desastres, como aquele que causamos para nós mesmos em águas internacionais, no alto-mar, ao largo das costas de Gaza.
Texto de AMOZ ÓZ na Folha de São Paulo de 02/06/10
Nascido em Jerusalém em 1939, Amós Oz é escritor e jornalista. Publicou 18 livros, traduzidos para cerca de 30 idiomas. Um dos fundadores do Movimento "Paz Agora", representa a chamada esquerda engajada, favorável à criação do Estado palestino. Ensina literatura hebraica na Universidade Ben GurionTradução de PAULO MIGLIACCI
Charge da Folha de São Paulo de 02/06/10
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