Pena que, a despeito da evolução representada por essas medidas, a PEC nada faça para reduzir a carga de impostos no Brasil
HÁ QUASE 20 anos, desde a Constituinte de 1988, vivemos em permanente processo de reforma tributária. É falso dizer que nada se fez nesse período para aperfeiçoar o sistema de cobrança e de arrecadação de impostos em vigor. As mudanças pontuais introduzidas na legislação em diferentes momentos contribuíram para torná-la mais racional e eficaz, permitindo uma relação mais transparente e civilizada entre o contribuinte -pessoas física e jurídica- e os órgãos arrecadadores.
Persiste, no entanto, a convicção de que o modelo de tributos no Brasil ainda pode melhorar muito. Os principais problemas e distorções são:
1) carga tributária elevada e desproporcional aos serviços públicos ofertados; 2) complexa, superposta e fragmentada tributação sobre consumo; 3) acentuada complexidade da base normativa; 4) excessiva concentração da base de contribuintes; 5) elevada taxação da folha de salários.
A PEC (proposta de emenda à Constituição) recém-encaminhada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao Congresso Nacional oferece alternativas para solucionar ou, pelo menos, minimizar três desses problemas.
A unificação da legislação sobre o ICMS, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, por exemplo, representa um enorme avanço em relação à legislação atual. Hoje, como se sabe, cada Estado dispõe de regulamentação específica sobre o ICMS.
São 27 diferentes legislações observadas e cumpridas pelos contribuintes.
Esse quadro é agravado pela chamada "guerra fiscal".
A PEC do governo estabelece que, nas operações e prestações interestaduais, "o imposto pertencerá preponderantemente ao Estado de destino da mercadoria ou serviço, ficando o equivalente à incidência de 2% do imposto para o Estado de origem".
Trata-se de medida que beneficiará mercados consumidores, como o Distrito Federal, sem prejudicar a receita de Estados considerados produtores, como São Paulo. O equilíbrio fiscal será mantido por uma espécie de câmera de compensação entre as unidades federadas.
Importante medida simplificadora do sistema é a criação do IVA-F, o Imposto sobre Valor Adicionado Federal, por meio da consolidação de tributos federais com incidências semelhantes. O IVA-F substituirá a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide-combustíveis), reduzindo a cumulatividade ainda existente nos tributos indiretos.
Percebe-se também a intenção de reduzir, ainda que de forma tímida, os encargos que incidem sobre a folha de salários. A PEC do governo elimina a contribuição social do salário educação, substituindo-a por uma destinação da arrecadação federal, e prevê a redução gradativa da contribuição dos empregadores sobre a folha.
Projeto de lei tratando do assunto será encaminhado ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo 90 dias após a promulgação da emenda. Pena que, a despeito da evolução representada por essas medidas, a PEC nada faça para reduzir a carga de impostos no Brasil, que segue entre as mais elevadas do mundo -35,21% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2006, segundo cálculo do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário).
Isso equivale a transferir todo ano, do setor produtivo para os cofres públicos, algo em torno de R$ 800 bilhões. Trata-se de uma relação perversa e díspar entre o volume de impostos pagos e a qualidade dos serviços públicos prestados à população. Espera-se que, nos próximos dias, o Congresso Nacional dê tratamento prioritário ao tema.
O processo de votação da PEC do governo, ainda em fase inicial, deverá evoluir nos próximos dias para um debate construtivo e produtivo sobre as propostas apresentadas.
É importante vencer mais essa etapa do processo de aperfeiçoamento do sistema de impostos no Brasil.
O próximo passo será encontrar alternativas para ampliar o universo de contribuintes e para reduzir, na medida do possível, a abominável carga tributária.
Da Folha de São Paulo de 19/03/2008
Texto de ADELMIR SANTANA, 62, formado em administração de empresas, é senador da República pelo DEM-DF, vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio e presidente do Conselho Deliberativo Nacional do Sebrae, dos Conselhos Regionais do Sesc e do Senac no DF e da Federação do Comércio do Distrito Federal.
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