domingo, 17 de agosto de 2008

Lei salva vidas

Para os que gostam de beber, que comemorem com um bom champanhe, e um bom táxi ao voltar para casa.


AO LADO DO retumbante sucesso da lei seca, começam a surgir movimentos para questionar a sua constitucionalidade. Alguns argumentam que o máximo de 0,2 decigramas de álcool por litro de sangue é um exagero. Outros dizem que a imposição do bafômetro força os cidadãos a produzirem prova contra si mesmos. Há ainda os que vêem a lei como uma afronta aos direitos individuais. Não vejo ofensa a direito nenhum. Todos continuam com total liberdade para beber o quanto quiserem. O que foi barrada é a liberdade, aliás inexistente, de um cidadão tirar a vida de outro devido a descontrole causado pelo excesso de bebida, que, comprovadamente, se manifesta a partir dos 0,2 decigramas. Tampouco tem cabimento dizer que o teste do bafômetro constitui prova contra si mesmo. Quando um policial revista um carro em busca de armas ou de drogas, ninguém reclama, como não reclamaria se todos os pilotos viessem a ser testados pelo bafômetro antes de voar. Por que então querer explorar essa filigrana jurídica para impedir o exame da alcoolemia? Penso que a lei recebeu um apelido errado. Seria "lei seca" se interferisse no direito de beber. Não é o caso. A nova lei simplesmente se soma às exigências para dirigir, ou seja, possuir carteira de habilitação, ter visão adequada, ser maior de 18 anos e estar sóbrio. Melhor seria chamar o novo diploma de Lei da Proteção no Trânsito. Defendo nesta coluna, há muitos anos, a restrição do horário de funcionamento dos bares e a proibição de dirigir embriagado. No primeiro caso, a lei que impôs o fechamento dos bares depois da meia-noite em São Paulo reduziu substancialmente o crime e a violência urbana. No segundo, a lei 11.705/08, em seu primeiro mês de aplicação, produziu uma queda substancial de acidentes, mortes e feridos, assim como uma grande economia para os hospitais. Mais importante do que isso é a preservação da vida e da saúde dos seres humanos, que, afinal, não têm preço. Com o aumento da frota de veículos e de motoristas de primeira viagem, os acidentes vinham crescendo de forma assustadora. Alguma coisa precisava ser feita. O Brasil possui uma enorme quantidade de leis. Mas são poucas as de boa qualidade. A Lei de Responsabilidade Fiscal é uma delas. A Lei das Falências é outra. Esta é mais uma. E o povo gostou. Cerca de 70% dos brasileiros apoiaram a sua promulgação. Só temos a comemorar. E, para os que gostam de beber, que comemorem com um bom champanhe, e um bom táxi ao voltar para casa.

ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES na Folha de São Paulo de 17/07/08

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