Concessões no Brasil vão garantir à OHL subsídios de até 340 milhões
Abatimentos constam no Fundo de Comércio Financeiro, uma ferramenta de estímulo do governo espanhol
Beneficiada por subsídios do governo da Espanha, a OHL (Obrascón Huarte Lain) deverá receber nos próximos 20 anos abatimentos entre € 300 milhões e € 340 milhões (o equivalente a R$ 757 milhões e R$ 858 milhões), fração do montante que será investido no Brasil a partir da compra de cinco dos sete lotes de rodovias federais leiloados em outubro.
Os subsídios se referem ao Fundo de Comércio Financeiro, a principal ferramenta para estímulo à compra de ações de companhias e participação em licitações públicas no exterior por empresas espanholas. Essa política de subvenção, alvo de investigação pela Comissão Européia, explica a ofensiva econômica de conglomerados ibéricos sobre a América Latina e os Estados Unidos, mercados promissores no setor de infra-estrutura de transportes.
O montante a ser deduzido pela OHL será de 15% a 17% do investimento previsto, de até 2 bilhões, nos próximos cinco anos, na sua nova malha viária brasileira, que inclui trechos da Régis Bittencourt (BR-116) e da Fernão Dias (BR-381). Pela legislação fiscal espanhola, os recursos poderão ser debitados de uma gama de impostos na razão de 5% ao ano ao longo de duas décadas. O incentivo à OHL também beneficiará a Acciona, que no mesmo leilão conquistou o direito de explorar a BR-393, entre Minas e Rio.
A estratégia se vale do artigo 12 da Lei 43/1995, Lei de Imposto de Sociedades. O texto permite que empresas, com sede fiscal na Espanha, amortizem o Fundo de Comércio Financeiro que resulte de aquisições superiores a 5% das ações de companhias estrangeiras ou do arremate de licitações públicas.
O argumento da legislação é “evitar a sobreposição econômica internacional sobre dividendos e rendas de fonte estrangeira”. Na prática, o benefício atrai novas holdings para a Espanha e também dá suporte financeiro para que as empresas do país cresçam no exterior.
O uso de vantagens fiscais tem sido denunciado por empresários brasileiros. Na quarta-feira, em Brasília, o ministro da Indústria, Comércio e Turismo da Espanha, Joan Clos, negou que seu governo promova subvenções proibidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) ou pela União Européia.
Clos tem razão: os subsídios ainda não foram declarados ilegais, mas são investigados pela comissária européia encarregada de competição, a holandesa Neelie Kroes. “Muitos crêem que esse sistema conceda vantagens às empresas espanholas para compras de companhias estrangeiras.”
Com apoio nessas subvenções, companhias espanholas retomaram o ciclo de investimentos, em especial na América Latina, a partir de 2003. Santander - também acionista do Grupo OHL -, Iberdrola e Telefónica têm sido algumas das maiores beneficiadas pela estratégia. Os subsídios estariam por trás de aquisições das companhias de telecomunicações O2, na Inglaterra, e TIM, no Brasil, pela Telefónica.
INTERNACIONALIZAÇÃO
Também auxiliaria, por exemplo, na compra da subsidiária brasileira do banco ABN-Amro/Real pelo Santander. Um dos maiores experts da Espanha em investimentos na América Latina, Alfredo Arahuetes, professor de Economia Internacional da Universidade Pontifícia Comillas de Madri, não crê que os incentivos possam ser considerados ajuda de Estado, mas reconhece que o Fundo de Comércio pesa na tomada de decisões de investimentos.
“Não é um instrumento fiscal normal. Tecnicamente é como uma poupança, em que parte do investimento para comprar uma empresa estrangeira é poupado na forma de isenções de impostos”, diz ele. “Os demais países da União Européia não o usam e não creio que aceitarão que a Espanha prossiga com isso além de 2008 ou 2009.”
Entre as empreiteiras espanholas, o Fundo de Comércio tem sido usado para tornar viáveis estratégias de internacionalização dos negócios. Passado o boom da infra-estrutura na Espanha nos anos 80 e 90, quando o país mais recebeu fundos da UE, o objetivo atual de parte das grandes empresas do segmento, como Ferrovial, Acciona, FCC e OHL, é buscar novas fronteiras de investimento, em especial em construção e concessões de rodovias.
Na Europa, Sacyr, Abertis e Cintra adquiriram direitos de explorar estradas na França. Na América, Estados Unidos, México e Brasil são os grandes focos, em razão da demanda por melhora da infra-estrutura dos programas de privatização de estradas nos três países e de suas extensões territoriais.
Nos Estados Unidos, em uma concorrência para a concessão de 251 quilômetros de rodovias em Indiana, das nove pré-qualificadas, quatro eram empreiteiras espanholas. Lá, a Ferrovial, a maior da Espanha, assumiu a dianteira dos negócios em um mercado potencialmente caro, mas estável e rentável, que estava nas mãos do Estado.
Ela participa, entre outros, do Trans-Texas, um programa de infra-estrutura de 50 anos, que exigirá investimentos entre 24,8 bilhões e 30,45 bilhões. Propriedade da família Del Pino, a empresa, por meio de sua subsidiária Cintra, tornou-se sócia estratégica do governo texano para projetar o Trans-Texas Corridor e terá preferência para exploração das praças de pedágios. A mesma lógica, de buscar a hegemonia em um grande mercado americano, é usada pela Acciona e pela FCC, que disputam as concessões no México.
MERCADO BRASILEIRO
No Brasil, o terceiro - e até aqui menos atraente dos grandes mercados americanos -, a hegemonia foi alcançada pela OHL graças à voracidade da empresa no leilão de rodovias federais, no qual ofereceu deságios entre 39,35% e 65,43%. A OHL Brasil, subsidiária local, é responsável por 62% da malha viária do grupo OHL Concesiones. O interesse da empresa em firmar posição no País também aumentou com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e com a expectativa do grau de investimento almejado pelo governo brasileiro.
A OHL tinha dificuldades de entrar no mercado interno espanhol, já consolidado, por não ser até os anos 90 uma das maiores do segmento. Assim decidiu expandir-se no exterior, acompanhando a aposta de 90% das grandes empresas do país.
“Brasil e Argentina apresentam condições econômicas e físicas muito atraentes para as empreiteiras espanholas. Serão grandes mercados de infra-estrutura e necessitam de investimentos pesados por terem grandes distâncias a serem cobertas”, diz Julián Coca, gestor de rentabilidade variável da empresa de consultoria Inversis.
O Estado tentou, durante três semanas, entrevistar o presidente do Grupo OHL na Espanha, Juan-Miguel Villar Mir, o presidente da OHL Concesiones, Juan Villar Mir de Fuentes, e outros dirigentes das empresas para esclarecer o uso dos subsídios. Pedro Zamarro, um dos coordenadores da IPPI Comunicación Corporativa, que assessora o grupo, informou que Villar Mir “não crê que seja o momento de falar à imprensa”, em especial sobre o Brasil, “já que os investimentos são futuros e o processo ainda está em curso”. Procurados, os ministérios da Fazenda e do Fomento do governo espanhol também não se pronunciaram.
Reportagem de Andrei Netto no Estado de São Paulo de 04/11/2007
Leia meu comentário sobre este assunto: A REVANCHE DA ESQUADRA ESPANHOLA
http://amorordemeprogresso.blogspot.com/2007/10/revanche-da-esquadra-espanhola.html
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