Equador 'deplora' reação do Brasil na crise com Odebrecht
Em um comunicado divulgado neste sábado, o governo do Equador disse que "deplora" a reação do governo brasileiro de adiar a visita de uma missão especial a Quito, em resposta à expulsão da construtora Odebrecht do país andino.
A mensagem diz que o governo "deplora que esta decisão tenha sido adotada em relação à situação entre o Estado equatoriano e uma empresa construtora privada deste país (Brasil)".
Na quinta-feira o governo de Rafael Correa rejeitou um acordo proposto pela Odebrecht, confirmando a expulsão da empreiteira do país.
A empresa foi acusada pelo governo de cometer irregularidades na construção da usina hidrelétrica San Francisco, que teve de ser fechada depois de um ano de uso.
A medida também cancela a construção de quatro projetos que estavam sob responsabilidade da construtora, cujos contratos totalizavam US$ 650 milhões.
A resposta do governo brasileiro veio de imediato, com o adiamento da visita do ministro de Transportes, Alfredo Nascimento, prevista para o dia 15, na qual seriam discutidos temas ligados a obras de infra-estrutura viária.
Corredor
Na nota, o governo equatoriano afirma que, durante a reunião realizada entre os presidentes do Brasil, Bolívia, Equador e Venezuela no final de setembro, em Manaus, eles concordaram em realizar um encontro de ministros de Transporte desses países.
Neste encontro, os ministros teriam como missão "avançar no propósito comum (...) de promover ativamente a integração regional (...), especialmente a infra-estrutura relativa ao 'Eixo Multimodal Interoceânico Manta-Manaus'", diz o comunicado.
Ainda em fase de negociações, o Eixo Multimodal prevê a criação de um corredor rodofluvial entre Manaus e o porto de equatoriano de Manta, no Oceano Pacífico, podendo passar também pela Bolívia, Peru e Venezuela.
Trata-se de um projeto que daria ao Brasil uma saída comercial no Pacífico, mas que pode estar ameaçado devido à tensão entre os governos equatoriano e brasileiro.
Petrobras
No comunicado, o governo do Equador amenizou o tom com em relação à Petrobras, que havia sido ameaçada há uma semana de ser expulsa do país caso a empresa não assinasse "o mais rápido possível" a renegociação dos contratos de exploração petrolífera.
As novas regras prevêem que o país arrecade todo o lucro obtido com a extração, em troca do pagamento dos custos de produção e uma margem de lucro às companhias estrangeiras.
Atualmente, o Equador fica com 18% do lucro obtido com o petróleo.
O governo Correa afirma na mensagem que "ratifica sua complacência pela disposição da empresa Petrobras de renegociar seu contrato com o Estado equatoriano e de se alinhar à política governamental de elevar a produção do (petróleo) cru".
O governo também diz "desejar" que a empresa continue operando no país.
De Claudia Jardim de Caracas para a BBC Brasil
Ontem a ELIANE CANTANHÊDE escreveu o artigo abaixo sobre o mesmo assunto
Brincando com fogo
Mesmo quem tentava defender o presidente do Equador, Rafael Correa, agora concorda: ele ultrapassou todos os limites e está brincando com fogo. Com a retração do crédito mundial, quem vai investir no Equador e na Bolívia?
Os EUA, que estão feito barata tonta? A Alemanha, a França ou o Reino Unido, que mal sabem o que fazer com eles próprios? Ou a Islândia, que fechou Bolsas e bancos? Se há um país com alguma capacidade ainda de investir nos vizinhos, por ser mais rico, por estratégica ou até por uma questão ideológica, esse país é o Brasil. Pelo menos por enquanto... Correa, pois, comete o maior erro que pessoas, partidos e países podem cometer: escolher o inimigo errado. Ele tanto tensionou que Lula ontem parou de dizer que era tudo "problema de política interna" e partiu para a briga. Numa briga Brasil-Equador, quem ganha?
Correa assumiu o compromisso com Lula, no dia 30/9, em Manaus, de que recuaria na expulsão da Odebrecht e permitiria que seus dois funcionários deixassem o país. Lula, então, enviaria missão técnica com o anteprojeto dos sonhos de Correa, unindo Manaus à equatoriana Manta. Mas Correa rompeu o compromisso e, em vez de recuar, avançou na expulsão da Odebrecht e nas ameaças contra a Petrobras e contra o BNDES. Lula enfim deixou de ser bonzinho e deu o troco: fim da reunião, adiamento sine die do Manta-Manaus.
Quando Evo Morales decidiu abrir a temporada de enfrentamento ao Brasil, ele tinha lá seus trunfos: Lula não queria caso com país pobre e com presidente indígena, vindo da esquerda. E, "last but not least", o Brasil efetivamente precisava do gás boliviano. Correa não notou a diferença. O Brasil, a Odebrecht e a Petrobras não morrem sem um projeto a mais ou a menos. Mas, sem a boa vontade, as empresas e as verbas brasileiras, o Equador fica a ver navios. E pode afundar nesta hora de crise.
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