Sem os tributos sobre alimentos, haveria um extraordinário efeito em cascata na economia
Na verdade, por trás do problema estão mesmo interesses muito distintos: tributos federais, estaduais e municipais compõem uma intrincada malha cuja modificação pode diminuir a arrecadação de uma ou mais daquelas instâncias. Como temos eleição a cada dois anos, ora candidatos a prefeito, ora a governador, ora para os diferentes Parlamentos, colocam resistência a uma reforma que possa eventualmente provocar algum desequilíbrio aos respectivos Tesouros.
Mas não é possível continuar com a atual carga tributária, que, em 2008, correspondeu a 35,8% do nosso PIB. Tamanha carga inibe investimentos e perturba o desenvolvimento. Ciente disso, recentemente o governo federal reduziu o IPI para a venda de automóveis, garantindo a continuidade do desempenho do setor, mesmo em tempos de crise.
Por outro lado, impostos muito elevados estimulam a sonegação. Quando governava São Paulo, Geraldo Alckmin reduziu de 25% para 12% o ICMS sobre o etanol; como resultado, a arrecadação cresceu e a sonegação diminuiu. É evidente, como regra geral, que impostos menores estimulam investimentos produtivos e desestimulam os sonegadores. Mas, no caso dos alimentos, há um dado adicional. Recentes estudos realizados pelo Departamento do Agronegócio da Fiesp, em parceria com a FGV, mostram que as famílias de menor renda (até R$ 2.000/mês), que representam 71% da população brasileira, gastam quase 20% de seus salários com alimentação.
A carga tributária brasileira sobre alimentos é uma das maiores do mundo, com média de 16,9%, enquanto na Europa é de 5,1%, e, nos Estados Unidos, menor que 1%. Desse modo, fica claro que a desoneração do PIS/Cofins da cesta básica e das carnes tem um efeito direto na melhoria da distribuição de renda no país. E, para mexer nele, não precisa haver disputa com governos estaduais e municipais, porque PIS/ Cofins é tributação exclusivamente federal.
No ano passado, estima-se que a arrecadação desses tributos sobre os produtos referidos (açúcar, arroz, biscoitos, café, carnes, farinha, feijão, frango, leite, macarrão, margarina, óleo de soja e pães) tenha sido de R$ 3,6 bilhões. O estudo mostra que, se todas as famílias deixarem de pagar essas contribuições, haverá um extraordinário efeito em cascata na economia, porque irão consumir mais alimentos e outros produtos, o que levará a um crescimento de 1,7% do PIB em até três anos. Como se explica isso?
Simples: o aumento da demanda sobre bens de consumo em geral exige aumento de sua produção. Isso gera investimentos, empregos e mais renda em diferentes setores (alimentos, vestuário, eletrodomésticos, móveis e utensílios), levando ao referido crescimento do PIB. São números importantes e de resultado tão direto sobre a renda das famílias quanto o próprio Bolsa Família. E, com custos menores, podem até mesmo ser um elemento para reduzir tais gastos no futuro.
Texto de ROBERTO RODRIGUES, 66, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula).
Na Folha de São Paulo de 15/08/09
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